Sociedade

Um Aconchego que une gerações na partilha de casa e companhia

  • Paulo Alexandre Neves

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Para quem vive só ou em isolamento social é uma forma de ter companhia; para estudantes, nacionais ou estrangeiros, que não tenham recursos financeiros para arrendar uma casa, uma oportunidade de encontrar onde habitar. No ano letivo 2021/2022, mais concretamente neste último trimestre, estão integrados 12 beneficiários (seis estudantes e seis seniores) no “Aconchego”, programa criado pela Câmara do Porto em parceria com a Federação Académica do Porto, e que procura que a experiência vá para além da mera partilha de uma casa, ou seja, combata o isolamento dos seniores e promova a relação intergeracional e o envelhecimento ativo.

Nesta quarta-feira, nos Serviços de Assistência Organizações de Maria (SAOM), decorreu o encontro anual dos participantes no “Aconchego”, numa troca de experiências salutar. O momento teve a participação do vereador da Educação e da Coesão Social, Fernando Paulo, e da vereadora da Saúde e Qualidade de Vida, Juventude e Desporto, Catarina Araújo, e demais dirigentes do Município, contando também com a atuação de um quarteto da Orquestra Juvenil da Bonjóia.

Fernando Paulo agradeceu o envolvimento de todos: Federação Académica do Porto, seniores que acolhem os jovens universitários e estes por aderirem ao programa e, desta forma, "acarinharem os seniores da cidade do Porto".

Já Catarina Araújo realçou a "enorme relevância do projeto, assim como a importância do envolvimento da FAP. Apesar da pandemia, a Câmara do Porto sempre acreditou no programa e manteve-o vivo.", sublinhou.

A presidente da FAP, Ana Gabriela Cabilhas, evidenciou, por seu turno, "a importância de criar pontes entre gerações e combater a solidão entre jovens e seniores e a resposta que o programa dá aos novos jovens universitários que chegam ao Porto."

Testemunhos de grande cumplicidade

D. Maria José, 98 anos, participa no programa Aconchego desde 2005. No encontro deste ano partilhou o gosto e conforto que sente ao ter uma jovem estudante de arquitetura, Giulia Poletto (brasileira), a viver consigo.

Idêntica satisfação foi demonstrada por Maria Teresa Vaz, 93 anos. Acolhe estudantes desde 2009 e testemunhou que, João Mira, natural da Serra da Estrela e a estudar Conservação e Restauro na Universidade Católica, "tem sido uma companhia e uma pessoa tão atenta como os meus próprios filhos". João Mira, que mora há três anos com Maria Teresa Vaz, reforça: "sempre me senti parte da família, desde o primeiro dia."

Já Maria Albertina, minhota, com 91 anos, acolheu Vinicius Pedra, brasileiro a frequentar o mestrado em Arqueologia na Faculdade de Letras da Universidade do Porto, ao mesmo tempo que trabalha numa empresa do setor. Ainda recentemente, o estudante confessou, aos microfones da Rádio Renascença, que viver na, como o próprio denomina, “casa de boas maneiras da D. Albertina” tem sido uma experiência de aprendizagem, mas sobretudo de amizade.

Adelina e João Costa, natural de Braga e estudante de conservação e restauro na Católica, partilharam as suas vivências, bem como Roberta, brasileira e estudante de arquitetura, que mora com Fernanda Lopes (que por razões de saúde não pôde estar presente), e Marco Martins, a fazer doutoramento em psicologia, que mora há três anos com Maria João Spratley, que, igualmente, por razões de saúde não pôde estar presente.

Reconhecimento nacional e internacional

O programa Aconchego dirige-se a pessoas com mais de 60 anos, residentes no Porto, que vivam só ou com o cônjuge, em situação de solidão e/ou isolamento social, e a estudantes, nacionais ou estrangeiros, que venham estudar para a cidade e não tenham recursos financeiros para arrendar um espaço.

Aos mais jovens é apenas solicitado que se comprometam com o acompanhamento e melhoria da qualidade de vida de seus anfitriões. Não sendo "cuidadores", devem assumir-se como uma companhia, principalmente à noite, e colaborar em tarefas como ir às compras ou à farmácia, esclarecer dúvidas sobre tecnologia, ou mesmo ajudar a preparar das refeições. Existe apenas uma taxa mensal de 25 euros para o dono da residência para fazer face ao aumento de despesas.

Devido à crescente visibilidade e sucesso do programa, várias organizações da sociedade civil têm demonstrado interesse em proceder à replicação da iniciativa noutros concelhos e cidades do país.

Mas também, internacionalmente, o “Aconchego” tem sido reconhecido. Assim, em 2010, foi premiado no concurso "This is European Social Innovation", promovido pela Comissão Europeia - Eurocities, devido ao seu potencial inovador e de empreendedorismo social.

Em 2012, recebeu o selo de Iniciativa de Elevado Potencial de Empreendedorismo Social, atribuído pelo Instituto de Empreendedorismo Social. Já em março de 2018 foi selecionado como uma boa prática “smart to-do/Ageing Summit”. Ainda em 2018, foi selecionado como uma “age-friendly housing practice”, através da WHO Global Network of Age-Friendly Cities and Communities e Grantmakers in Aging, no âmbito da iniciativa Innovation@Home.