Sociedade

Rui Moreira: “Estamos disponíveis para fazer mais salas de consumo assistido”

  • Paulo Alexandre Neves

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O presidente da Câmara Municipal do Porto não tem dúvidas que, atualmente, as entidades de saúde "investem menos naquilo que é a prevenção junto dos toxicodependentes que o Município do Porto na sala de consumo assistido" e que é necessário criar uma rede destes equipamentos no país, permitindo colocar, novamente, os toxicodependentes "na calha do Serviço Nacional de Saúde (SNS)".

Revelando que mais de dois terços dos utilizadores da sala de consumo assistido na cidade são de outros concelhos, o autarca portuense defendeu a necessidade de ser criada uma rede destes equipamentos no país. "Não estou a dizer que é preciso em todo o território nacional, mas uma rede que garanta que esta é uma resposta integrada e geograficamente explicável", afirmou Rui Moreira, durante a conferência "Livre de drogas", organizada pelo Correio da Manhã, a CMTV e o Município do Porto, que decorreu, esta manhã, no Teatro Rivoli.

"Este investimento tem de continuar a ser feito pelo Ministério da Saúde. Estamos disponíveis para fazer outra [sala de consumo] e se [for] preciso outra", garantiu, acrescentando: "A sala de consumo assistido custou-nos cerca de 700 mil euros. Sabem quanto o Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD), sucessor do Instituto da Droga e Toxicodependência (IDT), investe na cidade, durante um ano? 500 mil euros".

"O problema resolve-se com medidas de bom senso"

Sabendo que o consumo e tráfico de droga "não têm uma solução simples" e que é preciso olhar para esta problemática sob "várias dimensões", o presidente da Câmara do Porto, que estava acompanhado do vice-presidente, Filipe Araújo, e da vereadora da Saúde e Qualidade de Vida, Catarina Araújo, reforçou que "esta não é uma matéria exclusivamente securitária", revelando que nos bairros da Pasteleira Nova e de Pinheiro Torres há "uma situação de tráfico à vista".

Por isso, disse, o problema "não se resolve com medidas politicamente corretas", mas de "bom senso", dando o exemplo de os toxicodependentes, muitos deles com tuberculose multirresistente, poderem voltar a trocar as seringas usadas por novas em farmácias.

Aliás, Rui Moreira não entende a discussão que se faz à volta dos direitos, liberdades e garantias dos toxicodependentes quando, durante a pandemia, "tivemos de ficar em casa, por tempos ilimitados, para não propagar uma doença, que é menos letal que a tuberculose". "Há dois pesos e duas medidas. Temos memória do que se passou e, por isso, as pessoas com tuberculose multirresistente, e não precisam de ser só toxicodependentes, têm de poder ficar em isolamento forçado", acrescentou.

"Não contem comigo para demolir bairros"

Rui Moreira deixou, por outro lado, uma garantia: enquanto for presidente de Câmara não haverá demolições de bairros. "Não posso imaginar que, agora, vamos demolir o Bairro da Sé porque é muito propício ao tráfico de droga. Já foi reconhecido que a demolição de bairros foi um erro", reforçou, assumindo: "Não contem comigo para isso [demolir bairros]. Depois, amanhã, alguém a seguir a mim vai dizer que a culpa foi do presidente Rui Moreira porque demoliu o Bairro da Pasteleira Nova ou de Pinheiro Torres e transladou o problema para outro sítio".

A este propósito, e durante a conferência "Livre de Drogas", que antecedeu a declaração final do presidente da autarquia, o comandante da Polícia Municipal do Porto defendeu a necessidade de se avançar com um estudo científico para se compreender "o verdadeiro impacto" da demolição dos bairros do Aleixo e de S. João de Deus para se confirmar, ou não, "se as demolições ajudam" a mitigar e resolver este problema.

Por outro lado, António Leitão da Silva revelou que, este ano, já foram recolhidas 38,9 toneladas de resíduos relacionados com o consumo de droga, estimando que, a manterem-se os valores, sejam recolhidas quase 250 toneladas até ao final do ano.

Desde 2018 que a Câmara do Porto recolhe, no âmbito do programa "Porto, Cidade Sem Droga", resíduos provenientes do consumo de estupefacientes. Desde então e até outubro de 2022, tinham sido recolhidos 363.9 toneladas de resíduos.

Agentes policiais são recebidos com hostilidade

Num debate onde foram discutidos os problemas associados ao consumo e tráfico de droga na cidade, o comandante da Divisão de Investigação Criminal do Comando Metropolitano da PSP do Porto garantiu que o combate a este crime é uma das prioridades das forças policiais, que "estão cientes que este é um problema complexo". Rui Mendes adiantou que só nos bairros da Pasteleira Nova e de Pinheiro Torres, em 2022, foram detidos "500 suspeitos" de tráfico de droga.

Destacando que a ação policial nos bairros, bem como nas suas imediações, é "forte", o comandante da divisão da PSP observou, contudo, que o "investimento naquela zona sacrífica outras zonas da cidade" e que, na maioria das vezes, os agentes são recebidos "com hostilidade".

Por sua vez, o juiz de instrução criminal Pedro Miguel Vieira considerou "não ser fácil combater o tráfico de droga de rua", em particular se a droga vendida nos bairros for "atrativa", isto é, mais barata. "A quantidade de droga que entra no bairro [da Pasteleira Nova] é tão grande que permite vender 10 doses e oferecer duas", exemplificou o juiz.

Já o psicólogo Paulo Sarmento alertou para a falta de meios não só policiais, mas também ao nível da saúde, defendendo a reativação de recursos e instituições especializadas nesta temática e o desenvolvimento de programas de "dentro [do bairro] para fora", notando que muitos dos 3.500 residentes daqueles bairros "também são vítimas" deste fenómeno.

A jornalista de investigação do Correio da Manhã/CMTV Tânia Laranjo, que viveu mais de 20 anos no Porto, reconheceu que a situação que se vive nos bairros da Pasteleira Nova e de Pinheiro Torres piorou "nos últimos cinco anos". "Esta parte da cidade pertence aos traficantes", concluiu.