Política

Porto na linha da frente do processo da descentralização

  • Paulo Alexandre Neves

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O Porto deu mais um passo na área da descentralização com a assinatura, hoje, nos Paços do Concelho, dos autos na área da Saúde e da Cultura, neste caso com o acordo de transferência do Palácio de São João Novo para o Município do Porto. A cerimónia inseriu-se na sessão de receção ao Governo, por ocasião do Conselho de Ministros descentralizado no distrito do Porto, que decorre, hoje e amanhã, na cidade.

Na presença do primeiro-ministro, António Costa, a quem desejou "sucessos e venturas", e dos membros do governo, o presidente da Câmara do Porto lembrou que "o Município tem, ao longo dos anos, pugnado pela descentralização administrativa, convicto de que o conhecimento do território e a proximidade à população são decisivos para a boa governança pública".

Mas, disse Rui Moreira, "é preciso que essa descentralização traga não só novas competências e responsabilidades, mas também mais recursos humanos, financeiros e infraestruturais para os municípios".

"O atual modelo de financiamento dos municípios comporta diversos problemas. No caso de municípios como o nosso, a receita é excessivamente volátil e dependente de ciclos económicos", sublinhou o presidente da Câmara, acrescentando: "Por seu turno, a despesa corrente, nomeadamente em recursos humanos, cresceu exponencialmente e tem elevado grau de rigidez – o que coloca pressões orçamentais que não podem ser descuradas".

"O país não pode dar-se ao luxo de parar até às próximas eleições"

A iniciativa "Governo Mais Próximo", que decorre hoje e amanhã no distrito do Porto, é, na opinião de Rui Moreira, "uma excelente oportunidade para promover o diálogo e a cooperação com os municípios".

E mesmo perante o facto de o Governo se encontrar em fim de mandato "não esvazia de sentido e utilidade este Conselho de Ministros" no distrito do Porto. Pelo contrário, garantiu o autarca portuense, "há uma série de questões cuja resolução não pode ser adiada, sob pena de se comprometer o desenvolvimento da região Norte e de se defraudar os legítimos interesses da sua população".

"O país não pode dar-se ao luxo de parar até às próximas eleições. Ainda na ressaca da crise inflacionista, Portugal tem pela frente a difícil tarefa de prosseguir a convergência com a Europa num cenário de tensão geopolítica, arrefecimento económico e emergência climática", frisou.

Rui Moreira recordou, a propósito, "investimentos previstos ou aos que estão dependentes de fundos comunitários", como sejam os casos da Alta Velocidade – "cuja rápida execução é do maior interesse para o Porto e para a região Norte", disse – e da modernização do sistema ferroviário. "Perante as dificuldades atuais e as que se avizinham, o Governo tem a obrigação acrescida de garantir que o Estado continua a cumprir escrupulosamente os seus compromissos", vincou.

E acrescentou: "O país não pode perder o foco no PRR. Este plano é fundamental não só para a recuperação económica e social no pós-pandemia, mas também para a transformação do país a partir de um modelo de desenvolvimento mais inteligente, digital, inclusivo e sustentável".

Palácio de São João Novo vai passar para as mãos do Município

Na agenda deste Conselho de Ministros estão medidas e projetos importantes para a cidade. Desde logo, a assinatura do contrato de transferência de competências para o Município na área da saúde, “um processo determinante para o acesso da nossa população a cuidados médicos de qualidade e com prontidão”, reconheceu Rui Moreira.

O documento foi assinado pelo presidente da Câmara, pelo ministro da Saúde, Manuel Pizarro, e pelo presidente do concelho diretivo da Administração Regional de Saúde do Norte (ARSN), Carlos Alberto Nunes. A descentralização nesta área produz efeitos a partir do dia 1 de janeiro de 2024 e comporta encargos superiores a 5,2 milhões de euros.

Foi também assinado, por Rui Moreira e pelo presidente da Estamo – Participações Imobiliárias, S.A., António Furtado, o acordo de transferência do Palácio de São João Novo para o Município do Porto, com vista à criação do núcleo do Museu do Porto.

"Em todos estes casos, há, em comum, a assunção pelo Município do Porto de responsabilidades em áreas que são tipicamente do foro da Administração Central. Isto significa que tanto da parte do Município como do Governo existe um compromisso efetivo pela descentralização administrativa, enquanto instrumento de desenvolvimento local e regional", sublinhou o autarca.

Elogios à ação de António Costa

No seu discurso, Rui Moreira aproveitou ainda para elogiar e agradecer o trabalho desenvolvido por António Costa, enquanto presidente da Câmara de Lisboa e primeiro-ministro. "Mesmo que a relação de amizade na política possa estar sob suspeita, ouso o risco de me expor a esse crivo. Quero dizer-lhe, aqui, que sou seu amigo há muitos e muitos anos e que essa amizade perdurará para além das nossas funções públicas", afirmou.

Rui Moreira relembrou que ambos foram eleitos, como presidentes de câmara do Porto e de Lisboa no mesmo dia, em 2013, e que, na Casa do Roseiral, firmaram um pacto entre as duas cidades, em que Porto e Lisboa exigiam que o Governo reconhecesse plenamente e valorizasse as atribuições e competências legalmente atribuídas aos municípios em domínios como do planeamento, definição e gestão de transportes públicos nas cidades.

"É verdade que na questão da descentralização, ou mais recentemente nas políticas de habitação, nem sempre concordámos. Mas, pela minha parte, reconheço que o primeiro-ministro sempre me ouviu com atenção, mesmo quando discordámos", acrescentou Rui Moreira.

E concluiu: "Espero que mantenha o seu inquebrantável otimismo e continue disponível para servir a causa pública, que tanto lhe deve, e que precisa de homens como vossa excelência".

Porto, capital da descentralização

Já o primeiro-ministro destacou o processo, "nem sempre fácil" e "muito negociado, da transferência de competências do Estado para os municípios. "É um caminho que não está esgotado (...) Sei bem que, felizmente, há mais caminho para podermos avançar e, seguramente, quem depois vier esse caminho dará continuidade", salientou.

"O Porto foi, e bem, um dos municípios mais exigentes na negociação de transferências de competências", assegurou António Costa, destacando alguns marcos importantes para a cidade, como a assinatura do "Acordo do Porto", a abertura da unidade pediátrica no hospital de São João (o "Joaozinho"), a reabilitação do antigo liceu Alexandre Herculano, a cedência do quartel do Monte Pedral ao município e muitos outros projetos, que, com o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), "permitiram dar outra ambição".

Definindo o Porto como “capital da descentralização”, o primeiro-ministro garantiu que “não é só mais uma cidade, a segunda cidade do país. Lidera a macrorregião metropolitana, que se estende de Braga a Setúbal”, disse, lembrando, por exemplo, a municipalização dos transportes públicos na Área Metropolitana do Porto (AMP).

O primeiro-ministro assinalou também que esta edição do "Governo Mais Próximo" fica marcada por outro "passo importante na descentralização", nomeadamente a "conclusão da regionalização possível no atual quadro político", referindo-se à reforma nas Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR), que hoje assinam os primeiros contratos-programa com o governo.

António Costa garantiu que, apesar dos constrangimentos constitucionais, é dever do seu Governo "deixar tudo preparado" para quem o suceder e assegurar a continuidade do país na execução dos fundos comunitários e gestão do dia-a-dia. "Mesmo com os constrangimentos constitucionais que o Governo terá a partir da próxima sexta-feira, o país tem de continuar a funcionar. É preciso assegurar continuidade", disse.

Por fim, deixou um elogio ao presidente da Câmara: "Uma palavra amiga, de especial estima, agradecendo-lhe mais de 20 anos de amizade oito anos de intenso trabalho. Fizemos honra a um ditado. 'Amigos, amigos, negócios à parte'. A amizade não foi afetada e os negócios foram levados a bom porto. Obrigado, e viva o Porto".