Sociedade

Porto, cidade das camélias, eterniza flor em obras de arte (REPORTAGEM)

  • Inês Reis

  • Notícia

    Notícia

A flor mais icónica e acarinhada pela cidade ganha agora um lugar permanente num mural de arte urbana na Rua Antero de Quental, e numa instalação que, por estes dias, convive com os espaços verdes e floridos do Jardim de São Lázaro. A convite da Câmara do Porto, o artista urbano Third e a dupla de arquitetos FAHR021.3 homenagearam e eternizaram a camélia em forma de arte.

Nem os olhares mais desatentos conseguem ficar indiferentes ao mural inteiramente dedicado às camélias, que perfila e embeleza agora a lateral do edifício municipal no cruzamento entre a Rua Antero de Quental e a Rua de Damião de Góis.

Para o portuense Nuno Palha (Third), artista escolhido para personificar num grafiti a flor que navegou desde o continente asiático até ao Porto, a grande inspiração para a pintura intitulada a “Casa das Camélias” foi exatamente a afeição dos munícipes pela planta.

“Nesta imagem que criei, tentei representar a casa de um apaixonado pelas camélias, daí esta imagem de interior, que depois com um espaçamento também passa para o exterior. A abertura do céu, as próprias andorinhas que fazem uma referência à estação primaveril, quis que fossem um convite para o desconfinamento, para as pessoas poderem vir, ver e apreciar este trabalho”, detalha o artista, que já se dá por satisfeito se a obra suscitar sorrisos a quem para diante do sinal vermelho antes de seguir viagem. "Para dar-lhes alguma alegria ao longo destes dias”, comenta.

Quanto às tonalidades coloridas escolhidas para ilustrar o mural, em concordância com a atual estação do ano, Third explica que procura sempre conjugar cores e escolher um ambiente que “tente agradar ao maior número de pessoas possível”, até porque o principal objetivo da obra pública é exatamente o de “criar algo que as pessoas possam desfrutar”, refere.

O mural que cobre a parede lateral do departamento municipal de Comércio e Turismo está integrado no Programa de Arte Urbana do Porto. Foi "a melhor maneira de celebrar e de devolver as camélias à cidade" num ano tão atípico, afirma a vereadora Catarina Araújo, com o Pelouro da Juventude e Desporto. "O resultado está fantástico”, reforça a também presidente do conselho de administração da Ágora, empresa municipal que operacionaliza o programa.

Já no emblemático Jardim Marques de Oliveira, comumente conhecido por Jardim de São Lázaro, é possível vislumbrar por estes dias - além das várias árvores de camélias, agora em flor, que ornamentam os espaços verdes - uma instalação pensada pelo coletivo FAHR 021.3.

Os dois artistas e arquitetos de profissão, Filipa Almeida e Hugo Reis, construíram um objeto inspirado na fisionomia das pétalas desta planta e que pretende manter a tradição viva de comemoração da flor que a cidade adotou há cerca de 200 anos. “A ideia base parte muito deste próprio princípio de celebração do Porto enquanto cidade das camélias; de pegar nesta literalidade do símbolo e desconstruí-lo de alguma forma, num espaço de fruição e de recreio”, explica Hugo Reis.

Disposta num dos largos centrais do jardim, permitindo a quem atravessa os portões da entrada vislumbrar imediatamente a plataforma de metal, a obra pretende ser um objeto de encontro e convívio neste espaço verde da Invicta.

“É um desenho concêntrico, que envolve um bocado esta ideia de reunião, ainda mais nos tempos em que estamos. Os jardins podem desempenhar um papel muito importante nesse sentido das pessoas se aproximarem, associado também à própria celebração, às flores, à cor, a toda a alegria que possa suscitar”, acrescenta o arquiteto.

Já para Filipa Almeida, o propósito da instalação é esse mesmo: “dar um palco para as pessoas também poderem atuar e a peça não ficar concluída connosco, mas também com o trabalho e com a vontade das outras pessoas”.

Quanto à clara inspiração nos tons rosa da flor, a arquiteta conta que dada a variedade de espécies de camélias que podem ser encontradas no Porto partiram à exploração. "Foi um bocado escolher algumas cores que achamos que também faziam uma composição interessante e que pudessem simbolizar, de alguma maneira, o melhor possível a diversidade de espécies”.

Criada com o intuito de ser apreciada por todas as idades, para a dupla, que já foi responsável por outras intervenções na cidade (caso de "Metamorfose", ), o mais importante é que a obra seja “interpretada e apropriada”, e que pequenos e graúdos se “deixem levar, podendo trepar, sentar-se nela e até a decorar, tudo vale", desafiam os artistas. "Estamos na cidade e é isso que conta”, concluem.

A peça pode ser, para já, apreciada no Jardim de São Lázaro, onde vai permanecer até ao final do mês de junho, seguindo depois para aquela que será a sua morada definitiva, no Jardim do Parque de São Roque.

As duas obras de arte resultam de um convite lançado pelo município aos três artistas, perante a impossibilidade de realizar neste ano a já tradicional Exposição das Camélias, que durante o mês de março costuma encher a cidade de iniciativas em torno do tema.

“Não poderíamos deixar de celebrar aquilo que é a flor da cidade, a camélia, algo que fazemos nos últimos anos, de uma maneira muito especial, com uma exposição e com uma série de iniciativas”, justifica o vice-presidente da Câmara do Porto, Filipe Araújo.

Para o também vereador do Pelouro da Inovação e Ambiente, a escolha dos artistas em questão prendeu-se com o facto de “eles próprios saberem interpretar muito bem o que é ter esta flor na cidade e como é que a cidade convive com ela". "Estamos muito contentes por ter duas equipas que representam aquilo que melhor se faz na cidade nesse âmbito”, sublinhou.

Quanto à permanência das duas obras no espaço público, Filipe Araújo não tem dúvidas de que estas “vão durar”, uma vez que “marcam claramente aquilo que é o sentimento da população do Porto perante a camélia e isso também é muito importante. As pessoas sentem como um simbolismo, sentem que é algo do Porto, que é algo seu”.

Conhecidas também como japoneiras, estas flores com origem em países como a China, o Japão e o Vietname, têm uma forte ligação com a Invicta, pois foi a partir daqui que se expandiram por todo o Norte de Portugal e também pela Galiza.

Sendo já considerada património natural e cultural da cidade, desde 1984 que é festejada, no mês de março, com uma exposição e um concurso, que pretendem reunir alguns dos melhores exemplares.

Com uma riquíssima tradição de cultivo e criação de inúmeras variedades reconhecidas internacionalmente, o Porto é, por isso, a Cidade das Camélias por excelência, numa ligação que tem vindo a ser renovada a cada ano e que ficará agora reconhecida para a posterioridade, através das duas obras artísticas.