Política

Lei da contratação pública continua a dificultar a execução de projetos e obras do Município

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O assunto não é novo e sobre ele muita tinta tem corrido. Os municípios portugueses continuam a sofrer na pele as dificuldades causadas pela Lei da Contratação Pública e só um terço do montante previsto para obras públicas foi celebrado no primeiro semestre, avança hoje o JN. No Porto, o Executivo Municipal continua à espera de luz verde para substituir o sistema de semáforos de 1993, hoje obsoleto. No caso da construção do Terminal Intermodal de Campanhã, entre o lançamento do concurso e a consignação da obra esperou mais de três anos. 

No artigo do Jornal de Notícias, espelha-se o calvário que as autarquias atravessam para verem os seus projetos programáticos concretizados em obra. "Dos 2,671 mil milhões de euros previstos no lançamento de concursos públicos durante o primeiro semestre deste ano, celebrou-se apenas um terço. Ou seja, 842 milhões de euros", informa a publicação.

Uma situação recorrente ao longo dos últimos anos, desde que o princípio da resolução fundamentada foi extinto para as autarquias na Lei da Contratação Pública, o que impede os municípios de avançar com obras enquanto houver, por exemplo, processos de litigância entre concorrentes a correr nos tribunais.

"O próprio presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira, tem vindo a criticar a situação, exigindo medidas ajustadas ao Governo", assinala o JN. Com efeito, este é um dos cavalos de batalha do autarca, que há praticamente dois anos viu aprovada por todo o Executivo uma proposta de recomendação ao Governo, em que instava ao levamento do "efeito suspensivo automático" dos concursos públicos lançados pelo poder local.

Ao coro de críticas dos autarcas, junta-se agora a AICCOPN (Associação dos Industriais da Construção Civil e Obras Públicas). Ao diário, o presidente da AICCOPN, Reis Campos, afirma que tudo isto "é fruto de um quadro legislativo da Contratação Pública que está desajustado da realidade e que se transformou num entrave à concretização dos projetos que o país precisa de implementar".

Tribunal alega que substituição do sistema semafórico não é urgente

Com o processo de aquisição de um novo e moderno sistema de gestão de tráfego para a cidade em suspenso, o Município continua, conforme pode, a resolver questões ligadas a avarias dos semáforos, e procura, dentro do que lhe é permitido e está ao seu alcance, ir substituindo alguns equipamentos, mas está impedido de o fazer numa perspetiva integrada.

Os dez milhões de euros, adstritos pelo Município desde 2016, permitiriam uma gestão inteligente do tráfego na cidade. Avenidas ou artérias sem trânsito não veriam sinais fechados no vermelho durante muito tempo; os novos equipamentos permitiriam, por outro lado, controlar a velocidade dos veículos, como já acontece, a uma micro escala, na marginal em direção à Foz.

Mas a modernização do sistema, fundamental para dar resposta aos atuais desafios da mobilidade, está suspensa porque um dos concorrentes que perdeu o concurso, intentou, legitimamente, uma ação de impugnação, o que trava automaticamente o processo.

O Município do Porto ainda apresentou um requerimento para levantar o efeito suspensivo automático, em setembro de 2018, mas o tribunal não atendeu ao pedido, por não admitir o interesse público invocado. Para o tribunal, o Porto pode continuar a ter um sistema de semaforização com um software de 1993, não sendo urgente a sua substituição.

Não contente com esta decisão, a autarquia apresentou recurso, que não foi admitido pelo Tribunal Central Administrativo do Norte, invocando "extemporaneidade". Sobre este novo entrave, um novo recurso do Município: desta feita dirigido ao Supremo Tribunal Administrativo (STA).

Em março deste ano, um despacho informa que "a reclamação foi deferida e admitido o recurso", pelo que foi então "ordenada a sua submissão a apreciação preliminar pelo STA", dão nota os serviços jurídicos do Município.

Dois meses depois, em maio de 2020, "acordaram os juízes da formação de apreciação liminar da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo admitir ambas as revistas apresentadas", o que significa que, neste momento, o Município do Porto aguarda o acórdão final sobre o recurso que apresentou.

O que mudou na Lei

Antes de 2015, estas dificuldades não se colocavam às câmaras municipais, porque era-lhes permitido pela Lei desencadear mecanismos de resolução fundamentada e avançar para a execução dos contratos, mesmo que os litigantes continuassem a esgrimir argumentos nos tribunais, o que podem levar anos. Desde então, fruto de uma diretiva europeia, foram produzidas alterações legislativas que deixaram os municípios dependentes da litigância. No entanto, "as diferentes soluções legais adotadas noutros países demonstram que seria possível minimizar os efeitos dessas normas", argumenta Rui Moreira.

Obra do Terminal Intermodal só ao final de três anos arrancou

Entre o lançamento do concurso e a consignação da empreitada, o projeto para o futuro Terminal Intermodal de Campanhã (TIC), demorou mais de três anos. Uma obra fundamental para a mobilidade da cidade que, se não fossem estes contratempos, já poderia estar hoje concluída.

Cronologia

02-08-2016 Lançamento do concurso de conceção;

10-02-2017 Anúncio da solução vencedora do concurso de conceção;

26-05-2017 Assinatura do contrato para a elaboração do projeto do TIC;

22-05-2018 Assinatura do contrato para a revisão do projeto;

28-09-2018 Lançamento do concurso público internacional para a construção do TIC;

22-03-2019 Assinatura do contrato de empreitada para a construção;

28-03-2019 Submissão do Contrato de empreitada à fiscalização prévia do Tribunal de Contas;

22-07-2019 Visto do Tribunal de Contas;

23-09-2019 Consignação da empreitada do TIC.

Reconversão do antigo Matadouro

Situação semelhante sucedeu com a reconversão do Antigo Matadouro Industrial, projeto-âncora para o desenvolvimento de Campanhã, defende o presidente da Câmara do Porto. O visto prévio para a obra chegou somente em maio deste ano, depois de quatro anos sobre a apresentação do pré-projeto na Bienal de Milão.

Cronologia

14-04-2016 Apresentação do pré-projeto na Bienal de Milão;

01-08-2017 Lançamento do concurso limitado por prévia qualificação em DR e JOUE;

28-05-2018 Adjudicação ao concorrente Mota Engil;

01-08-2018 Assinado o contrato entre GO Porto e Mota Engil;

03-08-2018 Envio do contrato para fiscalização prévia do Tribunal de Contas (registado nos serviços daquele Tribunal em 06-08-2018);

27-08-2018 Primeiro pedido de esclarecimentos (registo de entrada na GO Porto em 28-08-2018); resposta ao primeiro pedido de esclarecimentos a 09-10-2018 (registado nos serviços daquele Tribunal em 11-10-2018);

25-10-2018 Segundo pedido de esclarecimentos (registo de entrada na GO Porto em 26-10-2018); resposta ao segundo pedido de esclarecimentos 28-12-2018 (registado nos serviços daquele Tribunal em 02-01-2019);

03-01-2019 Terceiro pedido de esclarecimentos (registo de entrada na GO Porto em 04-01-2019); resposta ao terceiro pedido de esclarecimentos a 23-12-2018 (registado nos serviços daquele Tribunal em 25-01-2019);

01-02-2019 Recusa do visto Acórdão 3/2019 (registo de entrada na GO Porto em 04-02-2019);

19-02-2019 Recurso à decisão (registado nos serviços daquele Tribunal em 22-02-2019);

24-04-2020 Acórdão dá provimento ao recurso da Câmara do Porto e concede visto.