Sociedade

Histórias da cidade: um empresário que chegou a Conde (de Vizela)

  • Paulo Alexandre Neves

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A sugestão para este artigo partiu de Nestor Borges, natural de Vila das Aves, licenciado em História e investigador fascinado pelo século XIX. Por email, enviado à Câmara Municipal do Porto, alertou para a importância que teve na cidade, e que se estendeu à região do Ave, Diogo José Cabral. Nome desconhecido para muitos, certamente, mas que faz parte da nossa história, se ao nome acrescentarmos o título nobiliárquico de Conde de Vizela. Quem foi, afinal, um dos maiores industriais do primeiro quartel do século XX, cujo centenário da sua morte se registou em dezembro de 2023?

Deixou um dos mais impressionantes edifícios no centro do Porto (nas fotos), considerada uma obra ímpar na malha urbana da cidade, finalizada pelo arquiteto Marques da Silva, destinada a alojar os escritórios da Fábrica do Rio Vizela, a sede do Club Portuense, bem como algumas lojas comerciais.

O alto reconhecimento pela sua ação empresarial ocorreu no reinado de D. Carlos, que, em dezembro de 1900, lhe atribuiu o título de Conde de Vizela. Atualmente, existem ruas com o seu nome na Vila das Aves e no Porto, aqui situada no centro histórico. Esta foi traçada no século XVII, por iniciativa do padre Baltazar Guedes. No lado poente é composta por um conjunto de edifícios imponentes e de fachadas regulares construídos no início do século XX, características físicas que, juntamente com uma ligeira curvatura, fazem com que a rua pareça mais longa do que na realidade é. Chamou-se Rua do Correio, por ali ter funcionado o correio-mor do Porto. Deve a sua atual designação, precisamente, a Diogo José Cabral, que detinha a propriedade das casas e terrenos do lado poente.

Político por um ano

Diogo José Cabral nasceu a 12 de dezembro de 1864, no Porto, e faleceu a 25 de dezembro de 1923, também nesta cidade, encontrando-se os seus restos mortais no jazigo que mandara construir no cemitério de Agramonte. O seu percurso escolar iniciou-se no Colégio de Campolide e após o liceu foi estudar para Inglaterra onde teve os primeiros contactos com o mundo do trabalho, em pleno empório industrial de Manchester.

Este estágio profissional trouxe-lhe a especialidade no crescimento da fábrica de fiação fundada em Negrelos (Santo Tirso) pelo seu avô, e desenvolvida pelo seu pai, tornando-a numa das maiores e mais bem equipadas da Península Ibérica.

Em reconhecimento das suas capacidades e competências, foi convidado a abraçar uma carreira política, tendo sido eleito deputado do Parlamento, entre 1896 e 1897, ano em que chegou à Comissão de Artes e Indústrias. Foi curta a sua experiência na política, concentrando-se preferencialmente na Fábrica do Rio Vizela, que geria com enorme sucesso.

Dirigente da AIP e filantropo

O título de conde, formalmente ligado ao desempenho industrial, verifica-se numa conjuntura de crise política que o conduz, inclusivamente, à direção da Associação Industrial Portuense (AIP), depois de uma intensa luta contra o governo central. Diogo José Cabral integrava a Associação de Classes dos Industriais de Algodão, que preparava uma fusão com a União dos Industriais do Norte, mas por divergências assumidas, e tornadas públicas, não chegou a exercer o cargo na presidência da AIP.

Ao herdar da sua mãe o património em Lordelo do Ouro, na Rua de Serralves, deixou ao seu filho Carlos Alberto Cabral – que lhe viria a suceder na sua obra industrial e patrimonial – as propriedades e a incumbência de continuar o seu legado, mantendo a capela que a mãe (avó de Carlos Alberto) havia mandado construir e dar o melhor destino à propriedade ali existente, o que veio a acontecer até ao património atual, primeiro com o filho Carlos Alberto Cabral, mais tarde com outro proprietário, o industrial Delfim Ferreira.

Diogo José Cabral foi também um filantropo. Há 100 anos, aquando da sua morte, não esqueceu o auxílio aos empregados da casa e quinta residencial, à Caixa Económica de Socorro dos Operários da Fábrica do Rio Vizela, à Santa Casa da Misericórdia do Porto, aos muitos amigos e tantos outros conhecidos.