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Histórias da Cidade: Prova-rainha em Portugal fez-se princesa no Porto

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“Pedalar para vencer. Para ganhar, outras vezes perder. Percorrer este chão, para chegar a Saturno, Plutão”. Ainda que a presente edição da Volta a Portugal em Bicicleta, que hoje termina, não tenha passado pelo Porto, há coisas que ninguém nos tira: esta música de um genérico televisivo com mais de duas décadas da cabeça, e a realização na cidade da primeira prova de bicicletas no país.

Foi em julho de 1880 que o Clube Velocipedista Portuense – fundado uns meses antes, e também ele pioneiro nestes grupos de pedaladas – juntou alguns amantes das duas rodas e organizou a primeira corrida de que há registo em Portugal. Os velocípedes partiram da Alameda de Matosinhos às cinco em ponto e, em pouco mais de 13 minutos, Aurélio Vieira, montado numa bicicleta batizada de “Veloz”, cortava a meta junto ao Forte de São João Baptista, na Foz.

Pelo então caminho de Carreiros, escrevia O Primeiro de Janeiro dias depois, “estendiam-se duas longas filas de povo para ver passar os contendores”. Ao pódio subiriam também W. Pulo e o seu “Ligeiro”, com 13 minutos e 24 segundos, e J. Minchin Junior que, montado no “Expresso”, fez a corrida em 14 minutos e 14 segundos. Do grupo de ciclistas faziam parte ainda o “Faísca” de C. Tugman, o “Relâmpago”, de J. Rego Junior, e o “Rattazzi”, de C. Almeida. Os prémios terão sido entregues no salão do Club Gymnastico.

Tal como 140 anos depois, a corrida despertou o interesse da maioria. “Efectuaram-se anteontem as primeiras corridas organizadas por este club, sendo a afluência de espectadores muito maior do que se esperava, e não havendo o mais leve incidente que perturbasse a festa”, narrava o jornal, descrevendo como “era a multidão que tornava difícil o trânsito” no Passeio Alegre, que viveu uma tarde de grande diversão

“É digno de aplauso a iniciativa do Club Velocipedista Portuense para com este género de recreios. O êxito das primeiras corridas foi completo, e assim será também, segundo cremos o dos subsequentes”, afirmava O Primeiro de Janeiro.

E assim foi. Em novembro, era a vez da Rotunda da Boavista se fazer pista para as bicicletas e as “Corridas de Outono”, que confirmaram o entusiasmo da primeira prova. “Palavra que gostei… velocípedes a toda a brida, música de Caçadores, Senhoras entusiasmadas, convidados formalizados, muito povo a aplaudir os “cavaleiros”, muita chalaça aos mais ronceiros, muita animação, muita reinação e, sobretudo, muita satisfação”, escrevia a publicação de humor “O Sorvete”.

A última corrida organizada enquanto Clube Velocipedista Portuense seria no final de 1883, nos jardins do Palácio de Cristal, dando lugar ao Velo Club do Porto, de que o rei D. Carlos era presidente honorário e o príncipe D. Afonso sócio.

Também no Porto seria criado o primeiro velódromo do país, em 1883, na Quinta de Salgueiros, pela Secção Velocipedista do Clube de Caçadores. Aliás, o interesse pela prática começava a fazer surgir diversos clubes dedicados ao ciclismo: o Sport In-Club, o Sport Club do Porto, o Grupo Velocipédico do Porto, o Clube Velocipedista do Porto, a Sociedade Velocipédica ou o Grupo Cyclista do Porto. E, a acompanhá-los, as publicações periódicas especializadas.

Anos mais tarde, nasceria o Velódromo Maria Amélia, onde agora vive o Museu Nacional Soares dos Reis. Era o maior recinto desportivo da primeira década do século XX no país, com capacidade para 25 mil espetadores nas corridas de bicicletas.