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Histórias da cidade: pergaminho atesta despesas do batizado do Infante D. Henrique

  • Paulo Alexandre Neves

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Guilherme Costa Oliveira

"Pergaminho das despesas do batizado do Infante D. Henrique" é um documento muito singular do Arquivo Histórico Municipal do Porto. Escrito em letra gótica cursiva, data de 1394, apenas quatro dias depois do nascimento de uma das personagens históricas mais amadas pelos portugueses, ocorrido a 4 de março. Constitui um dos mais relevantes elementos na sustentação histórica da naturalidade portuense de "O Navegador".

O documento faz o registo das despesas suportadas pelo Município do Porto com os festejos do batizado do Infante. Nele pode ler-se, por exemplo, que "Gonçalo Anes, criado de Lourenço Martins, alcaide de Leiria, declara ter recebido 440 libras do concelho por umas cordas para o taboado" ou "Diogo, criado de Adão Porto, chanceler da rainha, declara ter recebido 150 libras do concelho por ter tangido nas matinadas que se fizeram no baptismo do Infante D. Henrique".

Também Vicente Anes, criado do bispo do Porto, Vasco Anes, criado de João Vasques das Eiras, Janim, criado de Tradono, o gaiteiro Pedro Afonso ou Julião Malha declaram terem recebido idêntico valor para animar a cerimónia. Já Juça, latoeiro, "declara ter recebido 150 libras do concelho pela maça e cruz para o taboado".

Diogo, criado de Adão Porto, chanceler da rainha, declara ter recebido 150 libras do concelho por ter tangido nas matinadas que se fizeram no baptismo do Infante D. Henrique

O mais antigo testemunho escrito conhecido sobre a vida do Infante – e que esteve em análise por ocasião do décimo aniversário do programa municipal "Um Objeto e Seus Discursos" – retrata a cultura da época e o acontecimento histórico que os portuenses puderam, então, viver. Foi, muito provavelmente, a "Casa do Infante" (donde o topónimo), o local de nascimento do mais icónico protagonista da expansão marítima portuguesa e um dos maiores portugueses de sempre, eleito no âmbito do programa da RTP, "Os Grandes Portugueses" (2007).

Este pergaminho permite também revistar o Porto no final do século XIV, as relações da cidade com o poder régio e a afinidade com a nova dinastia, e o seu desenvolvimento político e económico. Por exemplo, e tal como foi referido por Amândio Barros, investigador do Centro de Investigação Transdisciplinar Cultura, Espaço e Memória da Universidade do Porto, durante a sessão de análise do pergaminho - que ocorreu, como não poderia deixar de ser, na Casa do Infante -, "foi o Porto a primeira cidade a manifestar apoio a D. João I". "O Porto era muito diferente. Tinha uma capacidade muito própria de resolver problemas que o Estado não conseguia", acrescentou.

Na sessão integrada no ciclo "Um Objeto e Seus Discursos", que teve moderação de Manuel Real, antigo diretor do Departamento Municipal de Arquivos, Maria João Oliveira e Silva, doutorada em História pala Faculdade de Letras da Universidade do Porto (FLUP), revelou que o pergaminho terá sido "feito oito meses depois do nascimento" do Infante e que as festas do seu batismo terão custado aos cofres municipais, numa conversão para a moeda atual, cerca de 2800 euros.