Cultura

Histórias da Cidade: Invicta Fábrica de Cinema

  • Cláudia Brandão

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Filmada em apenas cinco dias, em 1918, a adaptação cinematográfica do conto “Frei Bonifácio”, de Júlio Dantas, foi um dos primeiro passos para a caminhada que, anos mais tarde, faria do Porto uma peça de extrema importância para a Sétima Arte no nosso país. Uma decisão arrojada, de mãos dadas com processos inéditos em filmes portugueses, assumida pela Invicta Film, Lda, a primeira a realizar o Porto como Cidade do Cinema.

A obra foi sonhada por um homem, de seu nome Alfredo Nunes de Mattos, em 1910, à altura promotor dos espetáculos, exposições e projeção de filmes do recém-inaugurado Jardim Passos Manuel. Foi a vontade de produzir exclusivamente filmes sobre assuntos portugueses que fez nascer, no n.º 135 da Rua de Santo Ildefonso, a Nunes de Matos & Cia – (Invicta Film).

A produção era feita de “panorâmicas”, documentários de propaganda comercial, industrial e de atualidades, com relativo reconhecimento tanto em Portugal como no estrangeiro. O documentário sobre uma tragédia marítima em Leixões, “O Naufrágio do Veronese”, terá vendido mais de cem cópias para a Europa e Brasil.

Alguns anos se passariam, no entanto, até à constituição como empresa e à produção de longas-metragens. O investimento vem do banqueiro portuense José Augusto Dias e do comerciante de vinho do Porto, António de Oliveira Calém, além de outras personalidades que pagariam entre cinco a sete contos pelas cotas, e permitiria a escritura, em novembro de 1917, da sociedade Invicta Film Lda.. O capital de 150 mil escudos era uma quantia avultada.

No ano seguinte, a empresa compraria, por pouco mais de 27 contos, a Quinta da Prelada (conhecida como Casa do Carvalhido) à Misericórdia do Porto e seria nesses 50 mil metros quadrados e num palácio com traço de Nicolau Nasoni que a Invicta Film se tornaria a “fábrica de cinema” do Porto. A produtora passa a dispor de um estúdio, laboratório, casa de máquinas, camarins e espaço para carpintaria e pintura.

Primeiro a parte técnica. A empresa adquire duas máquinas de filmar, dois projetores, uma bateria de arcos voltaicos, geradores, 20 mil metros de negativos impressionados e o Cine-Magic, um processo inovador de reflexão cinematográfica, uma espécie de terceira dimensão, a realidade virtual da época.

E, a partir daí, ação. O arranque dos filmes na Invicta dá-se em 1920, com uma adaptação de “Os Fidalgos da Casa Mourisca”, de Júlio Dinis, e conheceria o êxito em Portugal e no Brasil, num exclusivo de exploração vendido por 160 contos. Seguir-se-iam “Amor Fatal” e “Barbanegra”.

Alfredo Nunes de Mattos e Henrique Alegria, o diretor artístico, ligado ao cinema Olympia, tinham viajado até Paris para trazer, além de material, pessoal especializado, entre eles um realizador. A escolha recai sobre o desconhecido Georges Pallu, a quem compete, também, a supervisão de toda a produção da Invicta Film durante os cinco anos que se seguiriam.

É Pallu quem realiza “Frei Bonifácio”, com estreia no Jardim Passos Manuel, e, no ano seguinte, “A Rosa do Adro” e “O Comissário de Polícia”. Mais tarde, faz a adaptação de “Amor de Perdição”, de Camilo Castelo Branco. É também ele quem recebe a visita inesperada de Rino Lupo, que acabaria por realizar “Mulheres da Beira” e nada mais, abrindo a janela para os problemas que levariam ao fim da produtora.

Mais sete filmes dali sairiam – “Quando o Amor Fala...”, “O Primo Basílio”, ou “Tempestades da Vida”, entre eles - mas as receitas não acompanham a vontade. Não havia o interesse das salas de cinema em filmes nacionais e a exportação vivia dias difíceis. O sucesso de “O Destino”, de Georges Pallu, e uma forte injeção de capital ainda trouxeram alguma esperança, mas, ironicamente, “A Tormenta” haveria de ser a última projeção da Invicta Film, que encerrou atividade em 1928. Aparelhos e máquinas fotográficas haveriam de desaparecer em leilão.

É para não deixar que este e tanto mais património seja esquecido e para que a Invicta se continue a afirmar como Cidade do Cinema que foi lançada, recentemente, a Filmaporto Film Commission. Além da promoção e regulamentação de filmagens na cidade, o projeto vai atribuir bolsas de produção e apoiar a formação.