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Histórias da cidade: as andanças de uma estátua

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Filipa Brito

Há no Porto uma estátua que, há mais de dois séculos, presta homenagem e simboliza a própria cidade. Tem uma história atribulada, envolta em dúvidas sobre a sua autoria, e uma existência itinerante.

Esta é uma história que podia começar com “Era uma vez...” A imagem e o espírito do Porto estão refletidos numa estátua que homenageia a cidade e os seus habitantes – mas o trabalho, intitulado “O Porto”, tem uma história algo atribulada, começando pelas dúvidas sobre quem foi realmente o seu autor, ao que se juntam as suas andanças pela cidade, com passagem por várias localizações antes de chegar ao seu sítio atual.

“O Porto” integra, hoje em dia, uma espécie de galeria de escultura ao ar livre no coração da cidade Invicta. Caminhando pela Praça da Liberdade e Avenida dos Aliados, até à Praça do General Humberto Delgado, os portuenses e visitantes podem desfrutar de vários elementos artísticos no espaço público. A começar pela icónica estátua equestre de D. Pedro IV, e sem esquecer a homenagem ao ardina, próximo da Igreja dos Congregados, neste lote incluem-se ainda os trabalhos “Menina Nua – A juventude” e “Meninos – A abundância”, ambos da autoria de Henrique Moreira. Em lugar de destaque, à frente do edifício dos Paços do Concelho, situa-se a estátua de Almeida Garrett.

Apesar de ser uma estátua com dois séculos, “O Porto” está na Praça da Liberdade, em frente ao edifício do Banco de Portugal, apenas desde 2013. Nesse ano regressou ao local onde já tinha estado, após andanças por vários lugares na cidade. Originalmente localizada na frontaria do antigo edifício dos Paços do Concelho, na Praça Nova (atualmente, Praça da Liberdade), a estátua ali permaneceu quase um século, até ser desalojada, por assim dizer, com a demolição do edifício para a abertura da Avenida dos Aliados, em 1916.

Acompanhou a Câmara do Porto na mudança para o Paço Episcopal (foto no Arquivo Municipal do Porto), junto à Sé, onde os serviços municipais funcionaram até 1957.

Começava uma existência itinerante, que viu a estátua passar pelos Jardins do Palácio de Cristal, como mostra outra foto do Arquivo Municipal. O trabalho escultórico conheceu várias outras localizações, tornou a passar pelos Jardins do Palácio, até ser colocado no terreiro da Sé. Em 2013 deu-se o regresso às imediações da localização original, na Praça da Liberdade, junto à Avenida dos Aliados.

A singularidade desta estátua e das peripécias que viveu fizeram-na entrar no imaginário coletivo do Porto. No final da década de 1960, uma ilustração de Cruz Caldas, publicada n’O Comércio do Porto (e disponível no Arquivo Municipal), fazia alusão à falta de limpeza nas ruas da cidade, representando a estátua “O Porto” num pedido socorro.

Há ainda a questão da autoria da estátua. A imagem do guerreiro, que segura na mão direita uma lança e na esquerda o escudo, e cujo capacete é ornamentado por um dragão, terá sido um trabalho a quatro mãos.

Atribuída ao escultor João Joaquim Alves de Sousa Alão, a estátua foi, na verdade, adjudicada ao mestre pedreiro João da Silva, segundo informações recolhidas pelo escritor, jornalista e historiador Germano Silva, autor de vários livros de história da cidade do Porto, em documentos históricos da autarquia.