Cultura

Histórias da Cidade: a honra e o mérito de quem dá o coração pelo Porto

  • Cláudia Brandão

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Porto.

Não é feriado, mas não foi data que estivesse fora de hipótese. Quando, em 1911, o Jornal de Notícias fez um inquérito para que a cidade escolhesse qual deveria ser a data do feriado municipal, mais de 6.500 pessoas votaram no 24 de junho, dia de São João. “Mas houve oito portuenses que não esqueceram o episódio da chegada do rei D. Pedro IV ao Porto, que mais tarde culminaria no episódio da libertação do cerco dos absolutistas.” Aliás, muito se deve ao monarca pelo cognome que a cidade ganharia algum tempo depois desse simbólico 9 de julho de 1832.

Invicta. Porque não houve cerco miguelista que a derrubasse. Nem exército nem população terão permitido a tomada da cidade, construindo uma série de fortificações desde a Quinta da China, em Campanhã, à Senhora da Luz, na Foz do Douro. Todo o Porto era uma fortaleza sob o comando de D. Pedro IV, o rei que chegara pelo mar para a defender após a retirada das forças realistas. No horizonte do monarca, estava o resgate do trono das mãos absolutistas do irmão. Nem a inferioridade numérica teve um peso negativo numa equação que durou mais de um ano.

No Porto, D. Pedro IV estabeleceu-se no Palácio dos Carrancas (onde atualmente funciona o Museu Nacional Soares dos Reis) e, mais tarde, dada a insegurança dos bombardeamentos, na casa dos Ribeiro de Faria, em Cedofeita, passando a assistir à missa na Igreja da Lapa.

Enquanto rei, tropas e população lutavam pela inviolabilidade da cidade, opondo-se ao cerco miguelista, o monarca não deixou de olhar para as obras e melhorias que podia trazer – e trouxe - ao Porto. Foi em homenagem à causa liberal – que era a de todos os portuenses – e à persistência e dedicação da população que, em abril de 1833, D. Pedro acrescentaria a insígnia e colar da Grã-cruz da Ordem da Torre e Espada do Valor, Lealdade e Mérito, assim como o título de duque do Porto ao seu segundo filho.

Foi a sua sucessora, a filha, D. Maria II, que alteraria, então, as armas da cidade oferecendo-lhes os símbolos do progenitor e atribuindo, enfim, o título que, mais tarde e até hoje, se usaria a cada frase. Invicta. Sempre a acompanhar a definição que a luta pela libertação lhe trouxe: “Antiga, Mui Nobre, Sempre Leal”.

Quando o Rei Soldado morreu, ainda tinha mais a oferecer: o coração de D. Pedro foi entregue à cidade que lutou ao seu lado durante bravos meses e as chaves para abrir o sarcófago na Igreja da Lapa estão religiosamente guardadas na gaveta da secretária do presidente da Câmara, seu fiel depositário. Sobre o escudo do brasão, ali estava um escudete vermelho com um coração a ouro.

É para celebrar quem engrandece a Invicta e quem a ela se dedica também de coração, em vários “campos de batalha”, que o Município do Porto realiza, a cada dia 9 de julho, a cerimónia de atribuição das medalhas de mérito da cidade.

“Saber e querer resistir, porque é esse um dos traços mais identificadores dos que nesta cidade ou a propósito dela fazem História. O desejo, porque é a vontade de um futuro melhor que alicerça as bases dos povos. O desejo da felicidade. É tempo, aliás, de a cidade estar unida nas suas missões e desígnios. Sem unanimismos, sempre com espírito crítico, sem medo. Sempre fiel àquilo que é o seu maior valor coletivo: o carácter. Sem trincheiras, mas sempre determinada a unir-se pelas suas causas, contra qualquer cerco que seja. Porque os piores cercos não são sequer os físicos, são os cercos imateriais".

As palavras são de Rui Moreira, na cerimónia de 2015. Valeriam hoje como há 189 anos. Para os mais recentes homenageados tanto como para o rei libertador.