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Estratégia municipal para as pessoas em situação de sem-abrigo está aprovada

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Miguel Nogueira

O Executivo Municipal aprovou esta manhã a Estratégia Municipal para a Integração de Pessoas em Situação de Sem-Abrigo 2020-2023, em reunião privada. A duplicação do alojamento de longa duração, o aumento do número de camas no Centro de Acolhimento Temporário Joaquim Urbano, a abertura de mais dois restaurantes solidários, um na Boavista e outro na Baixa, bem como o reforço dos programas capacitação e de integração socioprofissional constituem o leque de prioridades.

Na primeira reunião de Câmara presencial nos Paços do Concelho desde o início da pandemia, mas ainda realizada em formato privado, coube ao vereador da Habitação e Coesão Social, fazer um resumo do trabalho que o Município do Porto tem desenvolvido desde que assumiu a coordenação do NPISA (Núcleo de Planeamento e Intervenção Sem-Abrigo) Porto, em fevereiro de 2018, altura em que iniciou o processo de reorganização da estrutura, composta por 63 entidades e com um núcleo executivo de 11 membros.

O NPISA Porto, que reúne em plenário de dois em dois meses, está atualmente dividido em seis eixos de intervenção e há entidades que se responsabilizam diretamente sobre determinadas matérias, de acordo com a sua vocação e propensão para a resolução de problemas de determinada área. Por exemplo, o acompanhamento social é assegurado pela Segurança Social; as questões diretamente relacionadas com a (re)inserção profissional são geridas pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP); à Administração Regional de Saúde do Norte (ARS Norte) compete agilizar a estratégia no tocante aos cuidados de saúde; ou a Santa Casa da Misericórdia do Porto, entidade responsável pelo eixo da habitação.

Segundo o último diagnóstico, realizado em dezembro de 2018, existem na cidade do Porto 560 pessoas em situação de sem-abrigo, sendo que dentro deste número, 140 são sem teto, ou seja, vivem efetivamente nas ruas. Os dados também indicam que menos de 50% das pessoas nesta condição são originárias da cidade do Porto. Mas esta percentagem, clarificou o vereador Fernando Paulo, é na realidade menor. "Muitas pessoas em situação de sem-abrigo passam a ser consideradas nas estatísticas como cidadãos do Porto porque é aqui que formalizam o pedido de apoio social", esclareceu o responsável, relembrando que o concelho recebe um elevado número de sem-abrigo oriundos da Área Metropolitana do Porto, pois entendem que aqui têm uma maior rede de apoio e de respostas sociais.

Embora ainda não esteja concluído um diagnóstico mais recente sobre os sem-abrigo no Porto, o responsável pelo Pelouro da Habitação e Coesão Social, diz não ficar admirado com uma subida dos números, no decorrer na pandemia. Neste âmbito, deixou críticas à forma como foi conduzida a "libertação de presos" por altura da Páscoa, pois não houve acompanhamento das autoridades judiciais, que encetaram essa decisão. "Vieram para a rua em situação de pandemia. Isto tolhe qualquer planeamento", denunciou Fernando Paulo, que viu a Estratégia Municipal para a Integração de Pessoas em Situação de Sem-Abrigo 2020-2023 aprovada por maioria, com abstenção da vereadora da CDU, Ilda Figueiredo.

Embora tenha sido o entendimento da maioria independente não versar num documento que é estratégico críticas ao Estado Central, no debate sobre o tema tanto o vereador como o presidente da Câmara do Porto não se coibiram de fazer algumas observações. "Este é um assunto que deve ser tratado com a seriedade e discrição que merece", assinalou Fernando Paulo. Já Rui Moreira afirmou que "este é um assunto que dever ser tratado com enorme recato".

Para o autarca, "a 'política-espetáculo' tem, a meu ver, um efeito negativo, porque cria a ideia de que existe um remédio que não esta disponível nas farmácias". Tanto mais que se criaram expectativas, como as "promessas sucessivas de milhões para tratar deste problema, que não sabemos bem onde estão", acrescentou.

Alojamento de longa duração e integração socioprofissional

Um desses novos acordos é desvendado na mesma reunião de Câmara, em que consta uma proposta, também assinada por Fernando Paulo, para a celebração de um protocolo com a SAOM - Serviços de Assistência Organizações de Maria. A reconhecida IPSS da cidade, com quem o Município já colabora noutros eixos, vai assegurar a implementação do projeto "Porto Sentido - Habitação, Capacitação, Reinserção", que resulta de um consórcio com mais duas entidades: a Santa Casa da Misericórdia do Porto e a Província Portuguesa das Franciscanas Missionárias de Nossa Senhora.

O programa, que inclui a disponibilização de 32 alojamentos, engloba ainda integração socioprofissional, através de ações de qualificação e de capacitação dos utentes, com um ciclo de vida até 2022.

Face à relevância e dimensão da iniciativa, no processo de candidatura a financiamento europeu, a Câmara do Porto assumiu o compromisso de ser investidor social, cofinanciando o programa em 30% do seu valor global, cerca de 200 mil euros.

Neste âmbito, o Município tem ainda em curso protocolos de alojamento de longa duração com a Benéfica e Previdente - Associação de Socorros Mútuos e com a Santa Casa da Misericórdia do Porto, com capacidade para cerca de 17 pessoas, no global.

A criação de respostas de alojamento para estes cidadãos é mesmo uma prioridade para a autarquia, que identifica diferentes modelos de execução, entre os quais o sistema "Housing First" ou outro para pessoas em situação de sem-abrigo de longa duração com patologias de adição e/ou doença mental; o alojamento de longa duração com componente de integração socioprofissional; ou o alojamento de transição para a vida ativa.

Importa ainda, refere o mesmo documento, aumentar o número de vagas na Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados de Saúde Mental nas várias modalidades residenciais e em estruturas residenciais para pessoas idosas.

Aumento da capacidade no Centro de Acolhimento Temporário Joaquim Urbano

Apesar de a cidade já disponibilizar cerca de duas centenas de vagas em Centros de Alojamento Temporário, geridas por várias entidades dos Núcleo de Planeamento e Intervenção Sem-Abrigo (NPISA) Porto, o período de permanência nestas respostas é largamente superior aos referenciais, "devido à inexistência de soluções complementares que permitam a evolução para níveis mais ajustados de integração".

O diagnóstico, vertido na Estratégia Municipal, não exclui o Centro de Acolhimento Temporário Joaquim Urbano, gerido pela Câmara do Porto. Localizado nas instalações do antigo hospital especializado em doenças infeciosas, este projeto desempenhou um papel fundamental no período mais ajudo da pandemia, ao conseguir alargar, num curto espaço de tempo, a capacidade de resposta, ainda que temporariamente.

Neste momento, o Centro de Acolhimento Temporário Joaquim Urbano tem capacidade para acolher 35 pessoas, mas de acordo com a estratégia serão criadas condições para que o aumento do número de vagas possa crescer já entre este ano e próximo. Só em 2019, o equipamento recebeu 68 pessoas, o que significa que cerca de metade dos indivíduos foi reintegrada.

Mais restaurantes solidários para acabar com a distribuição de comida na rua

Por outro lado, a estratégia municipal compromete-se ao alargamento da rede de restaurantes solidários, por forma a cumprir o objetivo de substituir a distribuição de comida no espaço público. Está portanto prevista para breve a abertura de mais dois restaurantes solidários: o primeiro na Boavista e outro no centro do Porto.

Recorde-se que o Município tem duas estruturas em funcionamento: uma nas instalações do Hospital da Ordem do Terço, na Praça da Batalha, e outra nas instalações do Centro de Acolhimento Temporário Joaquim Urbano. Nestes espaços, a capacidade de fornecimento de refeições tem vindo também a ser progressivamente ampliada.

Foi esse, aliás, o principal motivo que levou a autarquia a reforçar a parceria que já tinha estabelecido com a SAOM neste âmbito. Além de beneficiar da experiência da IPSS na confeção de refeições para o exterior, o protocolo contempla ações de formação em hotelaria, como cursos de cozinha, com o objetivo de contribuir para a reinserção social de pessoas em situação de exclusão.

Estratégia Municipal atua em dez eixos

A Estratégia Municipal para a Integração de Pessoas em Situação de Sem-Abrigo (2020-2023) foi estruturada em dez eixos de intervenção e bebe da experiência que o Município adquiriu desde que assumiu a coordenação do NIPSA Porto, em 2018.

Os diferentes eixos detalham projetos de capacitação/formação; de participação e cidadania; e contemplam também cuidados de saúde para uma saúde oral digna. Neste plano, está ainda previsto o reforço da intervenção da Equipa Técnica de Rua, "com a contratação, ainda este ano, de um educador de pares".

Ainda assim, o grau de comunicação e interligação existente entre as diferentes equipas de rua, permite que o NPISA Porto saiba "praticamente ao minuto, que existe uma nova pessoa em situação de sem-abrigo", informou esta manhã o vereador Fernando Paulo, acrescentando ainda que está a ser criado um Observatório Social, de forma a obter informações mais detalhadas sobre este fenómeno, do ponto de vista social.

Por fim, neste documento estratégico fica ainda expressa a criação de uma Estrutura Residencial de Baixo Limiar, uma resposta destinada a pessoas em situação de sem-abrigo de longo termo e com ausência de condição para plena autonomia, mas com margem de incrementarem competências de sociabilização que os permitam prosseguir para respostas convencionadas, como por exemplo lar de idosos ou rede de cuidados continuados.