Economia

Rui Moreira alerta que o dinheiro não é única solução para pôr um país anémico a crescer

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O presidente da Câmara do Porto abriu a conferência “Fábrica 2030”, organizada pelo jornal Eco, na manhã desta terça-feira, 14 de dezembro, no Salão Nobre do Palácio da Bolsa. Sob o tema “Como é que vamos pôr o país a crescer?”, Rui Moreira partilhou a sua visão como autarca no que diz respeito ao contributo para a economia nacional.

Para responder à pergunta central da conferência, o presidente do Município reforçou a necessidade de uma mudança num país “estagnado há 20 anos”. “Quando olhamos para o crescimento português nas últimas décadas já podíamos verificar que havia um problema de anemia”, afirma Rui Moreira, atribuindo parte da culpa aos “fenómenos sucessivos que, de alguma maneira, nos vão enganando” como é o caso dos fundos que, acredita, servem “para nos dar uma folga. E nós, perante uma folga, vemo-nos na necessidade de não mudar”.

Outro dos culpados é, disse o presidente da Câmara do Porto, o discurso dos políticos “que, invariavelmente, dizem que somos os melhores do mundo”. “Por tudo e por nada somos sempre os melhores do mundo. E se nos convencermos que somos os melhores do mundo e que vem uma nova dose de dinheiro, um PRR [Plano de Recuperação e Resiliência] com que vamos tapar os buracos do Estado, e logo o Portugal 2030, a verdade é que continuamos a viver em anemia e astenia e o país, de facto, não cresce”, criticou Rui Moreira.

Analisando as últimas décadas, o presidente do Município do Porto diz encontrar um país “na cauda do desenvolvimento económico europeu, resignado a ser um país periférico”, um país “congelado”, com uma atividade económica assente “em atividades tradicionais, tendencialmente de pouco valor acrescentado e com graves limitações na incorporação de inovação e principalmente de know-how disruptivo”, um país com “falta de formação dos gestores”, com “graves dificuldades em exportar” muito devido à falta de inovação da produção, mas também por causa das “vias de transporte caras e desatualizadas da realidade internacional ou do elevadíssimo preço de combustível”.

A esta realidade junta-se a falta de capacidade de “atrair investimento e talento”, seja por “um desajustamento entre o seu sistema educativo e um tecido económico que ficou parado no tempo”, seja por “uma taxação brutal do rendimento dos trabalhadores”, e ainda o facto de Portugal ser “uma sociedade fechada em si própria, num mercado pequeno e limitado”.

Nesse aspeto, Rui Moreira salientou o facto de o Porto ter “tentado contrariar isto e hoje concentrar 19% de todo o universo de startups portuguesas, afirmando a cidade como o maior centro de empresas inovadoras em fase inicial do país”.

“Criem-se as condições e o país não falhará”

O presidente do Município acredita que, perante a crise provocada pela pandemia, os serviços públicos a nível local “têm evidenciado elasticidade e capacidade de adaptação em muito curto espaço de tempo, em circunstâncias adversas”, ao contrário dos do Estado central, que requerem “um elevado valor de investimento e reforma”.

Rui Moreira assume que “os fundos europeus são um importante instrumento de financiamento e de estímulo ao investimento empresarial e têm um impacto positivo nas empresas ao nível do investimento, da qualificação, da inovação, da competitividade e da internacionalização”. No entanto, defende que “o dinheiro não é a condição, ou solução, para o desenvolvimento económico, é apenas um instrumento”.

A priorização do setor empresarial privado é fulcral para o autarca uma vez que, afirma, “este é o único que efetivamente cria riqueza e emprego, exporta e contribui para o equilíbrio externo e orçamental”.

Para Rui Moreira, “se as empresas não forem o foco, a lição do passado repetir-se-á, o que se traduzirá em mais uma oportunidade perdida, numa geração perdida, o que é imperdoável não tivéssemos nós as pessoas, o talento e a vontade de sermos mais e melhor do que somos hoje”. E deixa o conselho: “criem-se as condições (e retirem-se os empecilhos) e o país certamente não falhará”.

“Bazuca” não serve para “fazer festa”

O presidente da Câmara do Porto trouxe à conferência algumas ideias centrais que acredita serem capazes de contrariar a dita anemia e, de facto, “pôr o país a crescer”. Entre elas, “apostar na inovação e no desenvolvimento de negócios de valor acrescentado, dando também capacidade crítica”, “proporcionar aquisições e fusões, se necessário através de meios fiscais”, “apostar fortemente na transição digital”, “aumentar a capacidade e qualidade de formação dos quadros”, “apostar na atração e retenção do talento já formado, promovendo boas práticas salariais e de progressão na carreira”, e também reconhecer o “papel fundamental da banca” no “financiamento das boas ideias e da inovação”.

Por último, Rui Moreira sublinhou a importância de “alavancar o crescimento económico num modelo de sustentabilidade ambiental e social sólido”. “A sustentabilidade ambiental só pode fazer sentido se for apoiada pela sustentabilidade social e essa está hoje, claramente, posta em causa”, afirmou, dando o exemplo do “profundo e preocupante envelhecimento da população, que não é alheio ao crescimento anémico”.

“Os populismos vão dizer-nos que um dia seremos mais ricos. Não acreditem. Só seremos mais ricos se formos capazes de projetar, de planear, de favorecer o mérito e de viver com aquilo que temos e aproveitar o que nos chega para mudar, não para continuar, não para ter uma folga, não para fazer festa”, concluiu Rui Moreira.

A conferência “Fábrica 2030” prosseguiu ao longo da manhã com as participações de diversos representantes do tecido empresarial nacional, como a Mota-Engil, Media Capital, Altice Portugal, Euronext Lisbon, EY, ou a Câmara de Comércio Americana em Portugal.