Habitação

“É uma questão imperiosa” investir para além da habitação social, diz Rui Moreira

  • Isabel Moreira da Silva

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Miguel Nogueira

O presidente da Câmara do Porto afirmou esta tarde, em sessão da Assembleia Municipal realizada por videoconferência, que o problema de habitação na cidade do Porto só poderá ser mitigado com respostas diversificadas, conciliadas com as necessidades da população. O Município do Porto tem 13% dos seus residentes a viver em habitação social, uma percentagem muito superior à média nacional de 2%, por isso, o autarca defende que a aposta municipal deve agora concentrar-se em soluções direcionadas para a classe média e para os jovens, não tendo qualquer “bloqueio ideológico” em fazê-lo em parceria com os privados.

Colocando o dedo na ferida, o presidente da Câmara do Porto disse durante o debate requerido pela CDU, que “não há fundos públicos disponíveis” capazes de resolver um problema que é crónico, estrutural e que é transversal a toda a Europa, e até ao mundo.

Por isso, face ao gigantismo da gestão de um direito que se confronta com um território que é escasso, defende que as políticas públicas de habitação sejam audazes e não se entrincheirem no investimento público clássico.

O caminho, acredita, tem de ser feito de mãos dadas com o investimento privado, pese embora não descarte a oportunidade de financiamentos do Estado, ainda que a “conta-gotas” – como é o caso do programa Primeiro Direito – ou da famosa “bazuca”, cujo nome reserva grandes promessas, mas que Rui Moreira desconfia que “poderá não ter cartuchos para tudo”.

Assim, face a uma realidade que também se adensou com o problema da pandemia, atirando milhares de famílias da classe média para uma situação periclitante, devido à perda abruta de rendimentos, o autarca defende um "mix de medidas" que concorram para mitigar a falha no mercado habitacional da cidade.

“Há instrumentos que devem ser vistos como amortecedores e parece-me que o Porto Solidário é um deles”, afirmou. Rui Moreira acredita que a fórmula do “cheque-renda” é um analgésico eficaz para sarar feridas imediatas, ao “subsidiar o pagamento das rendas ou à prestação bancária”, e lamentou até que ainda não tenha sido aproveitado pelo Estado Central.

Instituído em 2014, o programa municipal vai já na sua nona edição. No ano passado, alargou o apoio de 12 para 24 meses. “Esta é uma medida imediata. Temos de ter políticas que cubram as várias circunstâncias. A curto prazo, o Porto Solidário, sem dúvida. De muito curto prazo, o Porto com Sentido [programa que visa introduzir no mercado de arrendamento tradicional habitações a preços acessíveis]. De médio prazo, as reabilitações em edificado municipal, realizadas pela Porto Vivo, SRU. De longo prazo, os projetos para Lordelo do Ouro, Monte Pedral e Monte da Bela”, descreveu o presidente da Câmara do Porto, reforçando que a autarquia só conseguirá levar estes projetos avante com a muleta dos privados.

Uma observação em sintonia com a intervenção precedente do deputado socialista Rui Lage, que partilhou “experiências” bem-sucedidas neste campo, como a reabilitação da Ilha da Belavista e a requalificação do Bairro Rainha D. Leonor.

Além do PS, também o PSD vê nesta junção de forças com os privados uma forma de resolver o problema da habitação, confirmou o deputado Francisco Carrapatoso. No entanto, para a CDU este modelo - assim escalonado - não serve. Segundo o deputado Rui Sá, o problema está nos baixos rendimentos das famílias, o que justifica a aposta principal do município na nova construção de habitação social, que deverá ser custeada pelo Estado Central, dizem os comunistas.

Rui Moreira contrapôs este ponto de vista precisamente com os números de habitação social na cidade. De acordo com o presidente da Câmara do Porto, a oferta desta modalidade de habitação é, factualmente, muito superior àquela que se verifica noutras cidades nacionais e europeias. No Porto, há cerca de 30 mil pessoas a viver em habitação social, cerca de 13% da população, sendo a renda mensal paga por fogo, em média, de 52 euros. Isto contabilizado aos 48 bairros municipais existentes mais casas do património, sem contar com as casas património do IHRU.

“É normal que haja pressão sobre habitação social. Vamos ter sempre procura superior à oferta, a não ser que queiram aumentar o preço, que não é nossa vontade nem é permitido por lei”, contra-argumentou o autarca, recordando com o forte investimento municipal que tem sido feito na reabilitação do edificado habitacional e na sua manutenção, que até foi reconhecido pelas forças políticas. Desde 2013, ronda os 125 milhões de euros.

Bairro da Tapada vai ser candidato ao Primeiro Direito

Face a números tão expressivos no campo da habitação social, Rui Moreira reforçou que é preciso abrir caminho a outro tipo de investimentos.

Um deles, por exemplo, é o exercício do direito de preferência, que o Município ativou a partir de 2015 e que tem contribuído para “não desenraizar” as pessoas das casas onde viveram uma vida inteira (vantagem que pode ser também atribuída ao Porto Solidário, assinalou). Uma preocupação que ecoou ainda na intervenção da deputada Susana Constante Pereira, que destacou entre as prioridades o combate ao “bullying imobiliário”.

O instrumento, que só recebe oposição do PSD, além de fixar população, teve ainda o mérito de “formalizar o mercado”, sustentou Rui Moreira. “A Câmara não tem gasto dinheiro, antes pelo contrário. Tem feito um investimento. Só aquilo que fomos buscar em IMT [Imposto Municipal sobre a Transmissão Onerosa de Imóveis], acredito que mais do que compensou o dinheiro investido”.

E, para o Bairro da Tapada, que o Município adquiriu precisamente para travar a especulação imobiliária da ilha localizada nas Fontainhas, o presidente da Câmara do Porto revelou que está a ser preparada uma candidatura para a sua reabilitação no âmbito do Primeiro Direito.

Na proposta de revisão do PDM há também benefícios fiscais que estão a ser incorporados para a nova construção, pelo que rejeitou a proposta social-democrata de classificar toda a cidade como ARU (Área de Reabilitação Urbana), tema, aliás, que já tinha suscitado debate em sessões anteriores da Assembleia Municipal.

Parcerias com outras instituições

Rui Moreira reconhece que “o tempo político não acompanha tempo da necessidade”, e sabe que os objetivos expressos na Estratégia Local de Habitação vão sofrer inúmeros entraves, desde logo de ordem financeira.

Não obstante, o acordo de colaboração com o Instituto de Habitação e Reabilitação Urbana (IHRU) para realojar 3.800 pessoas, num investimento que ascende aos 56 milhões de euros, parece-lhe um bom ponto de partida.

E, depois, há um conjunto de projetos-satélite que podem ajudar a diminuir a frustração de resultados que serão sempre vagarosos. As residências partilhadas, projeto que tem progressivamente ganhado adesão entre os idosos em situação de solidão, ou ainda o Porto Amigo, que reabilita casas degradadas, com o apoio da Fundação Eng.º Manuel António da Mota, em parceria com o GAS Porto (Grupo de Ação Social do Porto) e a associação Just a Change.

O presidente da Câmara do Porto não descarta ainda a proposta levantada pela deputada do PAN, Bebiana Cunha, para olhar os modelos de cohousing e coliving, admitindo até haver disponibilidade municipal para “ceder terrenos municipais”.