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“Desporto no Bairro” e ILL-Abilities superam barreiras através do breaking

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O programa “Desporto no Bairro” apresenta na quarta-feira o concerto de encerramento da primeira edição. O espetáculo acontece no dia 9 de dezembro, às 20,30 horas, no Super Bock Arena – Pavilhão Rosa Mota, e marca a conclusão do projeto organizado pela empresa municipal Ágora – Cultura e Desporto do Porto, e implementado no terreno por Max Oliveira e pela sua equipa Momentum, a primeira equipa profissional de breaking em Portugal. Após três meses de aprendizagem, é altura de os jovens do “Desporto no Bairro” subirem ao palco, que vão partilhar com a equipa internacional de dança ILL-Abilities.

O projeto “Desporto no Bairro” foi lançado em setembro e envolveu jovens de oito bairros do Porto, nomeadamente Aldoar, Fonte da Moura, Viso, Ramalde, Cerco, Lagarteiro, Pasteleira e Pinheiro Torres. As crianças conheceram um novo estilo de vida, ao abraçar o breaking, inspirados e ensinados por Max Oliveira e pelos seus b-boys e b-girls da Momentum Crew.

Passados três meses do arranque do projeto, é altura de levar ao palco os 35 finalistas da primeira edição do “Desporto no Bairro”, com idades compreendidas entre os 6 e os 19 anos. O espetáculo, que servirá para os jovens mostrarem aquilo que têm vindo a aprender no projeto, terá entrada gratuita. Os bilhetes implicam reserva obrigatória (máximo 2 por pessoa), através do e-mail desporto@agoraporto.pt.

Ao lado desses jovens b-boys e b-girls dos bairros do Porto estará em palco a crew internacional de dança ILL-Abilities, formada pelo fundador Luca “Lazylegz” Patuelli, do Canadá; Sergio “Checho” Carvajal, do Chile; Jacob “Kujo” Lyons, dos Estados Unidos da América; Lucas “Perninha” Machado e Samuel Henrique “Samuka”, ambos do Brasil; e Jung Soo “Krops” Lee, da Coreia do Sul. “Lazylegz” e “Krops” não puderam viajar até ao Porto devido às restrições da Covid-19 em vigor nos seus respetivos países.

O Porto. juntou-se à conversa com os ILL-Abilities, no auditório da Biblioteca Municipal Almeida Garrett, momentos antes do início do workshop “Work & Share”, que se realizou no dia 4 de dezembro. Luca “Lazylegz” participou por videoconferência, diretamente do Canadá. Os b-boys partilharam a sua paixão pela dança, a forma como assumem a sua (d)eficiência e fazem dela a sua força e singularidade, moldando assim o cenário internacional do hip-hop. Foram convidados pela empresa municipal Ágora, no âmbito do projeto “Desporto no Bairro”.

Quem é que escolheu o nome ILL-Abilities?
ILL-Abilities é uma crew de dança internacional e somos todos de diferentes países; no total, de seis países diferentes. O “Samuka” de Brasília, Brasil, o “Perninha” do Rio de Janeiro, Brasil, o “Checho” do Chile, o “Kujo”, dos EUA, e eu, “Redo” da Holanda; o grupo tem ainda dois outros membros, “Krops”, da Coreia do Sul, e “Lazylegz” de Montreal, Canadá. “Lazylegz” é o fundador do ILL-Abilities e teve a ideia de criar um supergrupo dos melhores dançarinos do mundo que são portadores de deficiência. Juntos formamos a ILL-Abilities, e o nome vem basicamente da palavra deficiência, mas sendo que uma deficiência é sempre negativa, então substituímos o prefixo “dis” pela palavra “ill” e essa palavra significa literalmente “doente” – mas, no mundo do hip-hop, na verdade significa bom, pois se virmos algo de que gostamos, dizemos “ah, isso é bom, isso é doentio, é ill”.

Qualquer pessoa pode fazer parte do vosso grupo?
Não, não pode. Estabelecemos o grupo em 2007, os três membros originais do grupo eram o “Lazylegz”, o fundador, eu (“Kujo”) e um outro membro, Tommy de São Francisco, que se separou do grupo e desde então vive no Japão com a sua família. Além de nós os três, mais tarde começamos a colaborar com o “Checho”, e assim tivemos a ideia de formar um grupo.
O motivo pelo qual ninguém pode entrar é que as pessoas veem deficiências, e dizem “ah, é uma empresa, para onde posso enviar a minha inscrição e tornar-me membro?” Não, não funciona assim, porque no mundo do hip-hop um grupo funciona como uma extensão da família, ou mesmo uma segunda família. Muitas pessoas, no mundo do hip-hop, vêm da pobreza e não têm família, ou têm famílias desfeitas e, por isso, encontram a sua família na comunidade, onde veem as pessoas fazerem coisas que também querem fazer: pode ser rap, pode ser DJ, pode ser graffiti ou dança. Todos nós temos crews nos nossos bairros que são a nossa família; como já dissemos, escolhemos uma pessoa de um grupo e criamos uma super crew. Somos pessoas com deficiência e que estão distantes das suas crews e locais individuais. Numa crew, não se pede para entrar, é-se convidado a entrar.

Mas vocês passam a mensagem de que qualquer pessoa, independentemente da deficiência, pode ainda assim praticar a dança, ou qualquer tipo de arte. Vocês inspiram outros, daí o vosso lema: “Sem desculpas, Sem limites”. Certo?
Certo, mas pelo facto de as qualificações serem... não digo elevadas, mas quando se tem uma deficiência de qualquer tipo – e a minha é a de não ser capaz de ouvir, sou surdo – quer dizer que se tem essa deficiência, mas tem de se ser um bailarino excecional, e ser um b-boy, especificamente. Embora gostemos de todas as outras danças, focamos especificamente em b-boys e em b-girls.

Por falar em b-boys e em b-girls, já tiveram a oportunidade de ver o que os jovens dos bairros do Porto são capazes de fazer?
Sim, é fantástico, e pensamos que o mais importante em relação à dança é o facto de ser tão aberta a qualquer pessoa, ou seja, não se tem de ter um determinado rendimento para fazer parte de uma crew, ou fazer parte de um determinado estrato social, porque o breaking é realmente aberto e pode trazer muitas mudanças. A nós, mudou-nos as vidas, e agora, com este projeto no Porto, vemos o mesmo a acontecer. Não importa de onde se vem, tudo se resume à paixão e ao amor pela dança, que realmente mudaram as nossas vidas.
Foi o que fez por nós e, com a nossa crew, queremos focar-nos e realmente mostrar às pessoas que tudo é possível, independentemente de onde vimos, do tipo de deficiência que temos, da raça, cultura e género, isso não importa, porque partilhamos o amor pela dança, sentimos paixão pela dança e tudo é possível.

Treinam muito; quantas horas por dia ou por semana? É muito difícil?
O breaking é sem dúvida um estilo de dança difícil, é preciso muitos anos a praticar para se ser bom a fazer talvez um movimento; por isso, muitos de nós já dançamos há mais de dez ou quinze anos, sendo que o “Kujo” é o que dança há mais tempo (há 28 anos). Tem muita experiência. Os mais novos praticam muito, muitas horas por dia; quem quiser ser muito bom, tem que praticar muito.

Têm tido muito feedback por parte dos fãs e dos vossos públicos? De pessoas que inspiraram?
A ILL-Abilities tornou-se numa crew muito inspiradora para as pessoas, e recebemos muitas mensagens do género “a vossa crew é fantástica, inspirou-me e motivou-me e agora posso seguir aquilo que quero fazer”.

É como se fosse um ponto de partida para as pessoas?
Sim, mas também porque podemos viajar para tantos países, podemos, de facto, trabalhar em relação à perceção que existe sobre as pessoas com deficiência; nalguns países que visitamos, as pessoas com deficiência são mesmo uma minoria e elas só pensam nas limitações e que alguém não será capaz de fazer isto, e queremos derrubar as barreiras e construir pontes e mostrar possibilidades, mostrar o que é possível em vez de toda a negatividade.

O que significa fazer parte da ILL-Abilities?
Família; Perseverança; Esperança; Inspiração; Liberdade; Ágape (uma palavra grega), que significa um tipo de amor que coloca o amor pela comunidade acima do seu próprio e isso representa aquilo que somos, de uma forma especial.