Sociedade

Culturgest e o som sintético

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Florian
Hecker (Augsburgo, Alemanha, 1975) trabalha fundamentalmente com som sintético,
explorando desenvolvimentos específicos na composição musical da modernidade do
pós-guerra, na música eletroacústica, assim como em disciplinas não-musicais,
em particular na psicoacústica, área de investigação da relação entre as
propriedades físicas do som e as sensações auditivas.


Ao longo dos
últimos vinte anos, Florian Hecker tem recorrido a diferentes modos de
distribuição e receção do seu trabalho, posicionando-se simultaneamente no
campo da música erudita e no campo da arte contemporânea, e fazendo assim
chegar o seu trabalho a públicos com interesses distintos. A uma extensa
discografia que inclui mais de vinte e cinco títulos (muitas das suas obras têm
sido publicadas pela Mego Editions) junta-se a realização regular de
performances, apresentações áudio e concertos em importantes salas de concerto
e festivais de música eletrónica contemporânea.


Paralelamente,
e com cada vez maior frequência, Hecker tem desenvolvido as suas pesquisas
sónicas no contexto de galerias (o artista é representado pela Sadie Coles HQ
em Londres e pela Neu em Berlim) e de museus e centros de arte contemporânea (o
Museum für Moderne Kunst de Frankfurt foi o primeiro museu de arte
contemporânea a organizar uma exposição individual sua, em 2010).


Várias das
suas composições foram elaboradas tanto em versão de álbum como em versão de
três ou quatro canais para contexto expositivo. Ao longo dos anos, o artista
tem igualmente trabalhado em regime de colaboração, por exemplo, com o músico
Aphex Twin (com quem realizou várias performances), com o artista Ceryth Wyn Evans
(é exemplo a peça audiovisual No night No day, estreada no Teatro Goldoni, no
âmbito da Bienal de Veneza de 2011), ou com o filósofo Reza Negarestani (que
escreveu o libreto de Chimerization, produzida para a Documenta de Kassel, em
2012; Hinge, produzida para a sua exposição Articulação, no Lumiar Cité, em
Lisboa, em 2013; e A Script for Machine Synthesis, estreada há poucos meses no
Stedelijk Museum de Amsterdão). Em anos recentes, Hecker tem dedicado especial
atenção à tradução e problematização das questões e dos processos que estão no
cerne da sua prática artística em publicações cuidadosamente concebidas, sendo
Chimerizations (Primary Information, 2013) o caso mais eloquente.


Em 2015, foi
nomeado para o Berlin's Preis der Nationalgalerie, participando na exposição
correspondente no Hamburger Bahnhof em Berlim. Existe toda uma história de
utilização do som no campo da arte contemporânea, sobretudo a partir do final
da década de 1960, com a proliferação de obras em vídeo, de performances, ou da
imensa variedade de híbridos materiais e formais a que se convencionou chamar
instalação.


Contudo, num
contexto ainda hoje dominado pelos códigos da visualidade, mas também pelo
texto como elemento material e semântico de obras de arte e pela textualidade
como regime da sua interpretação e integração no mundo, as peças sonoras
abstratas de Florian Hecker constituem um exigente desafio às expectativas e
aos hábitos percetivos e cognitivos dos públicos de arte contemporânea,
induzindo uma experiência de radical desfamiliarização.


Há, nas suas
pesquisas sónicas, uma recusa intransigente da melodia ou do ritmo, de
referências ao mundo exterior e vivido, da representação e da narrativa. A
ênfase na materialidade do objeto (do som) enquanto coisa em si mesma aproxima o
seu trabalho da escultura minimalista.


As
afinidades do seu trabalho com a escultura minimalista vão, no entanto, muito
para além da questão da radical autonomia do objeto (do som) relativamente a
referentes e referências exteriores. Podemos considerar as suas peças sonoras
para exposição herdeiras da escultura minimalista no sentido em que o artista
transpõe para objetos sónicos e acontecimentos acústicos a investigação do
hiato fenomenológico ou da tensão entre a unidade do objecto (do som) e a
contingência da sua perceção (eminentemente auditiva).


Mutatis
mutandis, as suas composições, laboriosamente construídas com recurso a
tecnologias de som digital e orquestradas com apurado rigor formal e estrutural
no espaço expositivo, intensificam a relação indissolúvel e recursiva, tão cara
aos escultores minimalistas, entre o objeto, o espaço ativado pelo objeto e o
sujeito que perceciona (e assim reconstrói) o objeto através da sua experiência
situada no espaço e no tempo. Há alguns anos que a exposição é o formato que
mais interessa ao artista.


A disposição
e conjugação de diferentes fontes sonoras num espaço com características
específicas permite-lhe expandir o seu campo de possibilidades ao nível
compositivo, assim como amplificar a experiência sensorial, e o referido hiato
fenomenológico, em função de variáveis como o movimento e a posição do
espectador no espaço ou o modo individualizado como direciona a sua atenção.


Nesta
exposição, a mais extensa e complexa apresentação do trabalho de Florian Hecker
em formato expositivo, o artista construiu meticulosamente uma sequência, ou
melhor dizendo, uma constelação de treze peças sonoras, realizadas entre 2006 e
2015, que reverte numa complexa dramatização de objetos sónicos e
acontecimentos acústicos, em estreita relação com a arquitetura da galeria de
exposições da Culturgest no Porto.


No sábado,
dia 7 de novembro, às 16h haverá uma conversa entre Florian Hecker e Robin
Mackay.

Formulações, de Florian Hecker

Curadoria: Miguel Wandschneider 

Exposição | 26.09-19.12 | segunda-sábado,
12,30-18,30 horas | Culturgest Porto