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Conversas Sub-30: “A Orquestra Juvenil da Bonjóia ajudou-me muito para aquilo que faço hoje em dia”, afirma Marco Pereira

  • Paulo Alexandre Neves

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Filipa Brito

O Porto. estreia neste domingo uma nova rubrica, que dá voz e espaço a jovens portuenses proeminentes nas mais diversas áreas. O primeiro convidado das “Conversas Sub-30” é Marco Pereira. Nasceu no Porto, em 2001. É aluno de direção de orquestra do maestro Cesário Costa e frequenta o 3.º ano da licenciatura em Composição, na Escola Superior de Música e Artes do Espetáculo (ESMAE), orientado pelo compositor Rui Penha. Estudou na Escola do Cerco e integrou o projeto da Orquestra Juvenil da Bonjóia, como violoncelista. Inspirado num poema de Fernando Pessoa, compôs a obra vencedora da primeira edição do prémio OPART/Teatro Nacional de São Carlos (TNSC), “O Mostrengo”, já tocada pela Orquestra Sinfónica Portuguesa.

Como nasceu a vocação para a música?
Sempre me interessei por música, mas começou a tornar-se um caso sério por uma questão de sorte, curiosamente com a Câmara do Porto e o seu projeto “Música para Todos”. Quando passei do 4.º para o 5.º ano e para a Escola do Cerco [frequentou o 1.º Ciclo na Escola do Falcão] apareceu um panfleto, que, por acaso, a minha mãe não deitou fora e que falava na possibilidade de fazer audições, tocar um instrumento, aprender música, de uma forma mais intensa. Experimentei vários instrumentos e gostei muito do violoncelo. A partir do 10.º ano escolhi fazer dois cursos, em simultâneo: Ciências e Tecnologia e Música. Já no Ensino Superior, entrei em Enfermagem, na Escola Superior de Enfermagem do Porto (ESEP), e em Composição, na Escola Superior de Música e Artes do Espetáculo (ESMAE). Acabei por escolher apenas a Composição porque era e é aquilo que quero fazer.

Boas recordações da Orquestra Juvenil da Bonjóia, face visível do programa municipal “Música para Todos”?
Há muitas e boas. Foi o meu primeiro contacto com aquilo que é o trabalho de uma orquestra: fazer música em conjunto. Lembro-me de ter participado em muitos concertos, no Teatro Municipal Rivoli, no Campo Alegre, em vários pontos da cidade. Chegámos a ir a um concurso em Espanha. Foi toda uma multidisciplinaridade dentro da orquestra que fez com que tivéssemos várias oportunidades, passar por várias experiências e que, no meu caso pessoal, ajudaram para aquilo que faço hoje em dia.

Um balanço positivo e fundamental para as bases musicais…
Mais do que fundamental foi imprescindível. Foi, de facto, muito importante começar, desde cedo, a trabalhar com o outro, a fazer música em conjunto. É importante não só a nível musical como social.

Está a tirar o curso de Composição na ESMAE. Com que objetivo?
A partir do secundário comecei-me a apaixonar, cada vez mais, pela direção de orquestra e ser maestro. Na altura, um professor do Curso de Música Silva Monteiro aconselhou-me a composição. Ter uma boa base, mais forte, para a interpretação daquilo que é uma obra musical e estar à frente de uma orquestra. A direção [de orquestra] vai ser um objetivo, mas não me imagino também a não ser um compositor, a não criar.

É essa paixão que o leva a criar “Mostrengo”, obra já premiada?
É a minha primeira obra para orquestra sinfónica. O “Mostrengo” aparece na altura do confinamento. Partiu de um desafio do meu professor de composição da ESMAE: fazer uma obra que tivesse por base a estrutura de um poema [a partir da “Mensagem”, de Fernando Pessoa]. Foi curioso escrever uma obra em tempo de pandemia, descobrir que há mostrengos comuns.

A direção [de orquestra] vai ser um objetivo, mas não me imagino também a não ser um compositor, a não criar

O júri do concurso da OPART/Teatro Nacional de São Carlos realçou que “Mostrengo” é “uma obra muito bem conseguida em termos de conceito de poema sinfónico”. Para uma primeira obra é um grande elogio?
Significa que o trabalho teve mérito. Depois de um percurso tão longo é bom ver o nosso trabalho valorizado. Está-se a fazer um bom trabalho nas instituições nacionais ligadas à música. Não só o meu, mas também de muitos jovens compositores do nosso país.

Que sensações teve quando ouviu a sua obra ser tocada no Teatro Nacional de São Carlos?
É sempre um momento muito assustador ouvir, pela primeira vez, a nossa peça tocada por uma orquestra. Temos uma noção irreal daquilo que é quando estamos a escrever no computador. É muita coisa a acontecer ao mesmo tempo. O trabalho foi excelente e fiquei muito contente com o resultado e é sempre uma alegria poder partilhar e estar no palco juntamente com tão bons músicos. A experiência de ter tocado na Orquestra da Bonjóia fez-me ter cuidado naquilo que iria apresentar na partitura. Por isso, o feedback dos músicos foi muito positivo.

Quem o inspira todos os dias para estudar/trabalhar?
Desde logo, a minha mãe. Acompanhou-me sempre. É a minha principal fonte de inspiração. Depois, há dois professores, em especial, do Curso de Música Silva Monteiro, que não posso deixar de referenciar: Óscar Rodrigues e Ricardo Vilares. Mais recentemente, o professor Cesário Costa.

A minha mãe é a minha principal fonte de inspiração

Gostaria, um dia, de dirigir a Orquestra da Bonjóia?
Pode passar por um simples comentário a um programa, falar numa tertúlia musical, como aconteceu durante a pandemia. Estou sempre disponível para ajudar. Sinto que tive sorte, o apoio necessário para estar onde agora estou. Este é um projeto que procura pessoas com competências para poderem ser muito boas naquilo que fazem. É um exemplo para outras instituições e atividades do género.

Quais os seus horizontes?
A situação em Portugal é muito complicada. Ainda há poucas oportunidades para apresentar o nosso trabalho. Hoje em dia, o percurso normal de um músico passa pelo estrangeiro. Olho da mesma forma. Estou a pensar fazer o mestrado aqui [na ESMAE], mas a direção de orquestra passa por estar lá fora. Estou a pensar ir para a Alemanha, nunca esquecendo Portugal.