Habitação

Alterações ao programa Porto com Sentido estão aprovadas pela Assembleia

  • Isabel Moreira da Silva

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Miguel Nogueira

A Assembleia Municipal aprovou, nesta segunda-feira, as alterações ao programa Porto com Sentido, produzidas para simplificar as condições de acesso a uma iniciativa que nasceu em contexto de pandemia, mas que não se esgota nela. Ao colocar no mercado de arrendamento fogos de privados a preços acessíveis com apoio municipal, o programa dirigido à classe média está também a estimular o aumento de stock de habitação disponível na cidade.

A equação é simples: introduzir no mercado de arrendamento tradicional habitações a preços acessíveis, localizadas por toda a cidade, com o apoio do Município do Porto. É este o ponto de partida do Porto com Sentido, programa em que a autarquia assume o papel de intermediária ao assinar diretamente os contratos de arrendamento com senhorios, ao garantir o pagamento atempado das rendas e ao assegurar ainda a manutenção dos imóveis na condição em que foram entregues. Sem qualquer ónus acrescido para os inquilinos, a quem, pelo contrário, são subarrendados os fogos a um preço mais reduzido comparativamente ao real valor de mercado.

Sem olhar a tipologias – todas são aceites – e sem discriminar proprietários – sejam eles ou não de Alojamento Local – o programa anunciado em março pelo Executivo Municipal, foi agora ajustado para que possa abranger um maior número de pessoas.

Se o pagamento antecipado das rendas até dois anos já era possível na primeira formulação do Porto com Sentido, passa agora a ser igualmente viável o arrendamento de fogos que careçam de pequenas obras, uma vez que o Município disponibiliza-se também a adiantar rendas aos senhorios que tenham condições para as executar.

Mas é na revisão dos valores de renda no arrendamento, que contam com novos valores travão por tipologia, que reside a principal mudança. O princípio, sustentou a maioria independente na sessão extraordinária da Assembleia Municipal que decorreu nesta segunda-feira por videoconferência, teve como finalidade acomodar a disponibilidade do cumprimento da taxa de esforço de 35% para rendimentos correspondentes à classe média.

Vejamos. Para um T0 e T1 o limite máximo do valor de renda que o Município está disposto a pagar – a tal renda-travão – são 480 euros (neste novo enquadramento do programa também se elimina a diferenciação entre freguesias, sendo por isso o referencial igual para toda a cidade). O mesmo significa dizer que um casal que ganhe aproximadamente 11.520 euros por ano, com um rendimento bruto mensal a rondar os 825 euros por mês, pode ter acesso a um fogo T0 ou T1 pagando, no cenário mais exigente, 336 euros mensais (o valor máximo de renda já com o subsídio de 30%).

Quanto ao T2, o Município estabelece como travão os 780 euros. Assim sendo, podem candidatar-se aos fogos disponibilizados nesta tipologia agregados familiares com rendimentos anuais a rondar os 18.720 euros brutos, ou seja, a receber cerca de 1.340 euros brutos por mês. Quanto à renda a suportar diretamente pelos inquilinos que se enquadrem nestas condições, será, no máximo, de 546 euros mensais.

Por fim, a simulação para uma tipologia T3 ou superior. Neste caso, a Câmara do Porto estabelece como teto máximo os 950 euros, mas aos arrendatários o custo fixa-se, à mesma proporção, nos 665 euros. Considerando estes valores, ficam habilitados a concorrer famílias cujos rendimentos sejam próximos dos 22.800 euros brutos por ano fiscal, o equivalente a um rendimento bruto mensal de cerca de 1.630 euros.

Na sessão, o vereador da Economia, Turismo e Comércio, Ricardo Valente, esclareceu que as rendas-travão determinam o valor máximo que a autarquia está disposta a pagar, mas que estes montantes são apenas uma referência, lembrando ainda que os mesmos se encontram abaixo de todos os valores propostos pela Portaria n.º 176/2019, referente aos limites de renda aplicáveis no âmbito do Programa de Arrendamento Acessível do Governo.

Programa quer aumentar stock de habitação disponível na cidade

Na versão melhorada do Porto com Sentido, a autarquia abre ainda a possibilidade de celebrar contratos-promessa de arrendamento até um total de 200 imóveis, incentivando a respetiva reabilitação. De fora deste enquadramento fica, por outro lado, a majoração dos imóveis mobilados.

Segundo Ricardo Valente, “o programa é experimental” e, por isso, as dificuldades com que o Porto se depara são sentidas também noutros municípios, onde estão a ser testados programas semelhantes. “Estamos a experimentar, quer nós, quer Lisboa, quer Matosinhos. Estamos a experimentar, porque o Estado esteve ausente deste mercado nos últimos 20 anos”, reforçou o vereador, convicto de que estas alterações vão produzir uma subida na taxa de sucesso atual de 23% (considerando que, até ao final do ano, o programa prevê incluir 58 fogos, embora o objetivo inicial fosse alcançar os 250 fogos).

Nada também que tenha surpreendido Rui Moreira, que interveio na sessão para destacar que este programa “não consubstancia – por si só – uma política de habitação, porque essa é na verdade bem mais extensa”. Para o presidente da Câmara do Porto, os resultados da primeira fase do Porto com Sentido ficaram aquém do esperado devido à “pouca vontade” dos senhorios em colocar os seus imóveis no mercado de arrendamento. “Preferem ficar com as casas vazias temporariamente”, porque confiam que mais tarde ou mais cedo a crise vai passar, referiu.

De todo o modo, o vereador Ricardo Valente acredita que este é um programa moldado para “aumentar a oferta da habitação na cidade” e, na sessão em que as alterações foram aprovadas por maioria – com votos a favor do grupo municipal independente e do PS, abstenção do PSD, e votos contra das bancadas da CDU, BE e PAN, frisou que os contratos de arrendamento estabelecidos com os inquilinos são realizados por cinco anos, por isso oferecem estabilidade.

Nos argumentos a favor, o deputado socialista Rui Lage notou que esta nova versão do Porto com Sentido “tem a flexibilidade e polivalência que antes não tinha”. Ao analisar que inicialmente falhou um dos seus propósitos, o de servir de “tábua de salvação” ao setor do AL que sofreu um forte abalo com a crise, notou que esta se trata de uma atividade “muito importante para a economia local” e a maior parte é conduzida por pessoas singulares que a têm como única fonte de rendimento desde a crise económica de 2008/2009.

Já as forças políticas que votaram contra as propostas de alteração do programa invocaram como argumentos, sobretudo, os valores praticados nas rendas – a maioria independente justifica que este é um programa que atua sobre o mercado tradicional de arrendamento, mas que ainda assim apresenta tetos máximos de renda mais conservadores do que o próprio programa governamental – além de considerarem que não supre as carências habitacionais da cidade.

Operacionalizado pela Porto Vivo, SRU, empresa municipal que no seu conselho de administração é presidida pelo vereador do Urbanismo, Pedro Baganha, “o Porto com Sentido é uma de várias soluções. Temos de mobilizar todas”, ripostou o responsável, que destacou três frentes de batalha no combate à falha no mercado de habitação, transversal a todos os grandes centros urbanos.

Ao nível do investimento público clássico, pela “aquisição de solo” e de construção municipal, como é o caso do terreno de Lordelo do Ouro para onde existe um projeto de grande envergadura, ou ainda pelo exercício do direito de preferência, que começou a ser aplicado no anterior mandato.

Quanto ao investimento privado em solo público, com projetos como os que estão previstos para o Monte da Bela e Monte Pedral; e no tocante ao estímulo aos privados, por via do Porto com Sentido e de um conjunto de mecanismos urbanísticos que integram a proposta de revisão do novo Plano Diretor Municipal (PDM), elucidou Pedro Baganha.

Já para não falar, como sumariamente o fez o vereador da Habitação e Coesão Social, Fernando Paulo, naquilo que a autarquia tem promovido ao nível da Estratégia Local de Habitação, com programas pioneiros como o Porto Solidário, que promove o pagamento da renda a famílias carenciadas desde 2014 (e que para o próximo ano terá uma dotação orçamental recorde de 2,3 milhões de euros); com o investimento continuado no parque habitacional público, composto por 13 mil fogos, onde residem mais de 30 mil pessoas, ou seja, cerca de 14% da população da cidade, e onde o preço médio das rendas é de 56 euros; ou ainda através de parcerias com diversas instituições, associações e entidades, que vão promovendo significativas benfeitorias em habitações que se encontram em avançado estado de degradação.