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Abrem-se as portas e abrem-se os livros: é inaugurado hoje o espaço que vai acolher o acervo de Eugénio de Andrade

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Uma casa com livros pode ser muito mais do que uma biblioteca. É isso que pretende demonstrar a “Casa dos Livros”, o espaço instalado pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto no Palacete Burmester, que abre esta tarde as portas. Dedicada à literatura, a “Casa dos Livros” não se limitará a ser um depósito de volumes – está vocacionada para o estudo dos autores cujos acervos ali estão reunidos, entre os quais virá a estar o legado do poeta Eugénio de Andrade, cedido pela Câmara do Porto.

Ainda paira no ar um cheiro a novo: as obras de requalificação do Palacete Burmester terminaram há pouco tempo, e esta tarde é lá inaugurada a “Casa dos Livros”, espaço da Faculdade de Letras da Universidade do Porto (FLUP) que terá como missão a preservação, tratamento, valorização e disponibilização – a investigadores e público em geral – dos acervos literários ali depositados. O Palacete Burmester, à Rua do Campo Alegre, recebe o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, numa cerimónia que contará também com a presença do presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira, do reitor da Universidade do Porto, António de Sousa Pereira, e da diretora da FLUP, Fernanda Ribeiro.

A inauguração acontece poucos dias depois de ter sido aprovada pelo Executivo municipal, por unanimidade, a cedência do acervo do poeta Eugénio de Andrade, que prevê igualmente a atribuição de um apoio anual de 20 mil euros, durante três anos.

A diretora da FLUP foi a cicerone do portal Porto. numa visita à “Casa dos Livros” antes da abertura de portas: “Sabíamos que a Câmara do Porto tinha o acervo íntegro de Eugénio de Andrade, com as diversas componentes: correspondência, manuscritos, objetos, pintura, biblioteca. Por isso encaixa aqui muitíssimo bem e permite criar um equipamento cultural aberto à cidade, não apenas à academia, que extravase para além da própria investigação, para o público em geral poder usufruir”, enaltece.

As limitações de espaço na faculdade motivaram intervenção no edifício. “Aproveitámos para requalificá-lo, estas obras foram sobretudo na cave, que foi toda climatizada, reformulada, e equipada com estantaria compacta, para dar-nos mais capacidade”, explica Fernanda Ribeiro, acrescentando que o acervo de Eugénio de Andrade junta-se “a outros acervos que já cá temos neste centro da cultura, nomeadamente Vasco Graça Moura, o do poeta Albano Martins, que está em fase de inventariação ainda na casa de família, que esperemos que ainda este ano possa ser transferido para cá, de outros intelectuais como por exemplo Óscar Lopes, outros acervos digitais como de Herberto Helder ou Manuel António Pina.”

Um espólio íntegro

“Eugénio de Andrade é um dos maiores poetas contemporâneos e tem um acervo com uma relevância fortíssima ao nível do património documental, que deixou em legado ao Município do Porto. É um poeta traduzido em mais de 20 línguas, que recebeu vários prémios e distinções, e como tal é um orgulho para o Município do Porto ter um acervo desta natureza”, sublinha a diretora municipal de Gestão do Património Cultural, Cristina Guimarães.

O legado de Eugénio de Andrade inclui muito mais do que livros, acrescenta: “É constituído pelos manuscritos, que estão na nossa casa-forte, na Biblioteca Pública Municipal do Porto, que são cerca de 1400. Temos também correspondência, entre cartas, postais, cartões, que são cerca de 7400. E depois temos o acervo bibliográfico propriamente dito, que monta aos cerca de 17 mil exemplares. Para além disso, temos outros valores, como LPs, CDs, que tornam este espólio muito íntegro”. “É uma visão praticamente na íntegra de quem Eugénio de Andrade foi, e transmite-nos muito do que ele é. Os livros continuam na casa que foi sua, e irão agora conhecer um novo destino”, congratula-se.

“O acervo tem todas essas componentes e isso é distintivo neste centro cultural”, corrobora a diretora da FLUP, notando que o contexto de trabalho dos autores fornece pistas para a compreensão da obra: “Entendemos a criação como todo o contexto de produção: o que as pessoas escreveram, o que liam, e a interligação entre essas diversas facetas.”

Fernanda Ribeiro acrescenta que “a ideia é preservar, de uma forma sistémica, todo o contexto de produção destes autores e de toda a sua obra. Portanto, faz todo o sentido ter correspondência, ter inéditos – em alguns casos há coisas que estão escritas e nunca chegaram a ser publicadas. Há uma relação entre todos estes documentos, chamemos-lhes assim, que ganham um outro sentido quando são vistos em toda a sua complexidade.”

“É nossa intenção todos estes acervos serem tratados, catalogados e disponibilizados online para serem consultados. Esse trabalho exige ainda algum esforço”, conclui a diretora da FLUP, lembrando que a “‘Casa dos Livros’ foi o nome que atribuímos a este espaço, que começou por ser instituído como Centro de Estudos da Cultura em Portugal da Universidade do Porto. Como ele foi criado a partir do legado da biblioteca e arquivo do acervo documental de Vasco Graça Moura, e no seu contexto de trabalho original se chamava ‘Casa dos Livros’, acabámos por adotar esse nome, agora ressignificando-o e dando-lhe um outro sentido.”

Eugénio de Andrade, pseudónimo de José Fontinhas, é um dos maiores poetas portugueses contemporâneos, com uma obra traduzida para mais de 20 línguas. Foi distinguido com diversos prémios, com destaque para o prémio Camões em 2001. Em 2023 assinala-se o centenário de Eugénio de Andrade, cujo programa prevê a realização de um colóquio internacional sobre o poeta e uma grande exposição biobibliográfica.

A cerimónia de inauguração da “Casa dos Livros” pode ser acompanhada em direto aqui.