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Cities Forum 2020: entrevistas com Ahmed Aboutaleb, Begoña Villacís Sánchez e Elisa Ferreira

  • Dulce Pereira Abrantes

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O Porto foi sede do Cities Forum 2020, realizado na Alfândega do Porto, nos dias 30 e 31 de janeiro, que reuniu na Invicta os presidentes de câmara das principais cidades da Europa para debater o tema das cidades sustentáveis, sob o lema "Juntos formamos um Futuro sustentável". O evento foi organizado pela Comissão Europeia, Direção Geral de Política Regional e Urbana e pela cidade do Porto.

A Comissária Europeia para a Coesão e Reformas, Elisa Ferreira, presidiu o evento, juntamente com o presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira.

Representantes das principais cidades europeias participaram do evento e partilharam boas práticas, conhecimentos e ideias debatidas no âmbito do objetivo comum de uma Europa unificada.

Ahmed Aboutaleb, presidente da câmara de Roterdão, Begoña Villacís Sánchez, vice-presidente da Câmara de Madrid, e Elisa Ferreira, Comissária Europeia para a Coesão e Reformas, acederam a falar ao "Porto." sobre a Europa e o futuro das cidades.

O autarca holandês e jornalista de ascendência marroquina destacou que o futuro da Europa "está realmente dependente do futuro das cidades" pois, à medida que mais e mais pessoas vivem nas cidades, também "a riqueza é gerada nas cidades. E o mercado de trabalho está nas cidades, a inovação está nas cidades, a transição energética está nas cidades, os hospitais estão nas cidades, as instituições culturais estão nas cidades". Por isso, Ahmed Aboutaleb considera "realmente importante que aprendamos a trabalhar juntos, entre estados nacionais, governos nacionais, parlamentos e câmaras municipais, para mudar a maneira como gerimos as nossas economias e as nossas cidades. E isso é uma verdadeira lição para a Europa: tentar encontrar outro foco, em vez de ter um foco nos governos nacionais; mudar um pouco o foco para as cidades".

Ahmed Aboutaleb partilhou, ainda, a sua discordância com o facto de a Europa ser sempre relacionada com a ideia de economia, "mesmo porque as pessoas devem lembrar-se que a Europa tem a ver com paz e estabilidade".

De acordo com o presidente de Roterdão, a razão pela qual se estabeleceu a União Europeia deve ser esclarecida a todos os cidadãos: "foi porque não queremos mais uma grande guerra na Europa. Queremos, antes de mais, uma Europa unida e forte contra todas as turbulências que podem levar à guerra. Por isso, o corredor entre Paris e Berlim é muito importante ", reforçou Aboutaleb.

"Para mim, a Europa significa paz, estabilidade e não economia em primeiro lugar. A economia vem depois. Temos 50 milhões de consumidores na Europa, por isso somos um dos principais blocos em termos de economia, a par dos Estados Unidos e dos chineses. Somos um continente rico, pelo que temos muitos consumidores ricos. Queremos dizer algo no mundo, em termos de negociação de acordos com os EUA, com os chineses", enfatizou o presidente de Roterdão, acrescentando ainda que o próximo capítulo sobre a Europa é "construir uma Europa dos cidadãos".

Proximidade dos cidadãos

Perguntámos à vice-presidente da Câmara de Madrid, Begoña Villacís Sánchez, qual era o papel das cidades na Europa e qual a relevância desse papel para que os cidadãos se sentissem menos desconectados da ideia de Europa. Begoña argumentou que isso poderia ser um paradoxo, já que "existem dois tipos de política que coincidem: por um lado, o local e, por outro, o europeu; o interessante é que o local é o mais próximo do cidadão, e os cidadãos percebem que o europeu é o mais distante deles ", destacou.

"Acho que a Europa, ao trabalhar com as cidades, torna as suas políticas mais familiares e que os cidadãos se sentem mais europeus, porque a Europa faz muito pelos cidadãos e, ao mesmo tempo, as cidades precisam de se tornar mais visíveis na Europa, já que este não é o século dos estados, mas o século das cidades, que se estão a tornar mais importantes. E as cidades precisam de se capacitar para ganhar mais competências, a fim de resolver muitos problemas que nelas ocorrem, tais como a habitação, o isolamento, a poluição, coisas que acontecem nas nossas cidades e que podemos ver primeiro, porque somos a política mais próxima", afirmou a vice-presidente de Madrid.

Begoña Villacís Sánchez também expressou a sua admiração sempre que visita o Porto, porque "é uma das minhas cidades favoritas de toda a Europa. Cativa-me!".

O cenário de Elisa Ferreira

Elisa Ferreira, a Comissária Europeia para a Coesão e Reformas, também conversou com o "Porto." e explicou o papel da Comissão Europeia e como se pode tentar evitar cenários como o Brexit (saída do Reino Unido da União Europeia).

"As cidades são grandes centros de reflexão e discussão e também de dinâmicas económicas e culturais, naturalmente. Então, acho que cabe às cidades - e esse também é o seu papel - estabelecer uma relação estreita que existe, mas que ainda não é visível, entre o cidadão e a União Europeia. E acho que essa é uma das lições que precisamos tirar do Brexit, que é saber por que houve cidadãos que, quando se perguntou ?o que é a Europa para vocês?', disseram ?quero sair!'. Isso faz-nos refletir e a política de coesão está à procura de respostas, porque o nosso lema, o que nos move é ?não deixar ninguém para trás', e é por isso que devemos ser capazes de chegar ao cidadão e dizer-lhe ?você está connosco, você não é dispensável, todos pertencem a este lugar, todos devem sentir que fazem parte desse projeto comum".

No entanto, "isso não é fácil,mas os Média têm um papel a desempenhar e podem ajudar substancialmente. De facto, devemos não apenas fazer propaganda, mas chegar ao cidadão. E esse trabalho deve ser feito de baixo para cima ", afirmou Elisa Ferreira. 

A Comissária Europeia explica que esse trabalho deve ser realizado diariamente e garante que "é o que tenho feito: visitei as áreas mais remotas, acabo de chegar da Silésia, conversei com cidadãos, sindicatos, mineiros, presidentes de câmara. Porque o desenvolvimento começa de baixo e segue o seu caminho ascendente, e as cidades são ferramentas excecionais para isso".

Além disso, Elisa Ferreira instou as cidades a serem "mais visíveis também quando se trata de combater a marginalização", pois não se pode "deixar as pessoas para trás porque, ao fazer isso, essas pessoas ficarão desapegadas - até emocionalmente - de todo o processo, e dirão ?isso [a União Europeia] não é para mim. Sou contra!'".