Política

"O centrão não quer descentralizar quer passar tarefas para os municípios"

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Em entrevista ao Jornal 2, o presidente da Câmara do Porto afirmou que a cidade não está interessada em subscrever o acordo entre o Governo e a Associação Nacional de Municípios, porque o mesmo iria condenar o princípio das boas contas. Alertou que o que está em causa "não é nenhuma descentralização" e responsabilizou o "centrão", que diz também existir na ANMP, de só querer passar tarefas.

À transferência de tarefas sem poder político associado, Rui Moreira diz "não, obrigado". Tanto mais que o acordo que a Associação Nacional de Municípios (ANMP) fez com o Governo pressupõe que "os municípios passem a assumir funções menores, ainda por cima não transferindo os recursos que são necessários para essas tarefas, aligeirando assim o orçamento de Estado", declarou ontem à noite, no Jornal da RTP 2, o presidente da Câmara do Porto.

Na conversa com o jornalista João Fernando Ramos, o autarca recordou que, desde o início do ano, "as Áreas Metropolitanas do Porto e de Lisboa trabalharam muito" neste dossiê. Chamou à memória a Cimeira de Sintra, "que contou com a presença do primeiro-ministro e do Presidente da República" e onde, sumariamente, se definiu um acordo para a descentralização. Entre os pressupostos, indicou, tinha ficado desde logo assente que "se as competências que estão nas direções regionais passassem para os municípios, as autarquias teriam de receber os respetivos recursos".

Ora, sucede que com o acordo alcançado entre a ANMP e o Governo isso não acontece, apontou Rui Moreira. "Ou gastamos mais [do que aquilo que o acordo prevê] e são as nossas populações que vão ter menos serviços da Câmara prestados noutras áreas, ou gastamos aquilo que nos transferem - e sendo já menos do que aquilo que é hoje gasto - vamos prestar um mau serviço aos cidadãos". Com a agravante - sublinha - de serem depois os municípios responsabilizados pelo estado de coisas.

Rui Moreira não tem dúvidas de que "a descentralização dificilmente será feita de forma consensual". Isto porque o arco governativo PS e PSD é a maior força de bloqueio à concretização do processo. De todo o modo, por muito que haja vontade do poder político, "que o próprio primeiro-ministro, pela sua experiência autárquica, queira descentralizar", mesmo que "haja vozes independentes que se levantam dentro dos partidos, como são os casos dos presidentes de Câmara de Gaia, Sintra, Fafe, Famalicão", a verdade é que - diz - "o centrão que existe dentro na ANMP" não está disposto a lutar por uma efetiva descentralização e contenta-se em "passar tarefas".

"Tarefas não, obrigado"

Não interessa ao Porto assumir tarefas, declara Rui Moreira. "Principalmente se não formos pagos para prestar o valor suficiente para essa tarefa como já é prestada, e que não é grande coisa". E avisa do perigo para a cidade se aceitasse o acordo: "Iríamos ficar com tarefas de que a população já tem hoje razões de queixa, com um cheque ainda menor".

Nessa medida, mais do que haver uma dilação no prazo até três anos, como já sugeriu o PSD, entende o presidente da Câmara do Porto que "a forma mais democrática de resolver isto é cada um dos municípios dizer se está ou não interessado".

Dando consentimento a estas negociações, frisou uma vez mais, "o ónus para os cidadãos do Porto seria terrível". De resto, opinião partilhada pelos 17 presidentes de Câmara que integram a Área Metropolitana do Porto: "todos, sem exceção, disseram que as contas não batem certo".

Como exemplo do que este pacote de medidas propõe, referiu que "nos centros de saúde não estamos interessados que nos transfiram o dinheiro para termos de pagar o táxi do médico quando vai visitar o doente ou para compor um vidro quando está partido". Mais do que isso - e de todas as reuniões antecedentes havidas entre as Áreas Metropolitanas foi deixado claro - "gostaríamos sim de ter influência em aspetos que são importantíssimos para a população, como é o horário de funcionamento. Isso não nos é dado", lamenta.

Para além da saúde, também na área da educação o cenário é semelhante, revela Rui Moreira. "O Estado propõe que os municípios tratem de tudo o que é manutenção das escolas e dos consumíveis, mas o património continua a pertencer-lhe". Já a área da coesão social "ficou totalmente de fora deste acordo".

Recordando o seu discurso de tomada de posse há quase cinco anos, o presidente da Câmara do Porto repetiu que "a descentralização tem de existir, mas não pode ser uma forma de o Estado central alijar responsabilidades". Cinco anos depois, "aquilo que estão a tentar é um engodo", que até pode dar a ilusão a alguns municípios de que vão resolver o problema da dívida, admite o autarca, mas que não engana os cidadãos do Porto.