Economia

Autarcas do Norte querem ser ouvidos no planeamento de investimentos

  • Notícia

    Notícia

Fase de recuperação económica pós-pandemia exigirá colaboração entre todos os responsáveis, defenderam autarcas da Região Norte na conferência do JN. Particularidades da região terão de ser abordadas com planos específicos para cada caso.

No painel que encerrou a manhã da conferência do JN, promovida em parceria com a Câmara do Porto, que hoje decorre no Teatro Municipal do Porto - Rivoli, um grupo de autarcas da Região Norte, cada um representando uma comunidade intermunicipal, defendeu que o poder local deve ser escutado na definição das prioridades de investimento para a recuperação económica do país. A pandemia colocou desafios sérios e acentuou dificuldades, e por isso a crise económica que provocou terá de ser combatida com planos adaptados a cada contexto. Há uma "solução a Norte", defendeu hoje o presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira, num artigo de opinião no JN.

Subordinado ao tema "A Dimensão Territorial: Contrastes e Desafios da Coesão", o painel foi inaugurado pelo presidente da Câmara de Tabuaço, Carlos Carvalho. "Andamos a velocidades diferentes na Região Norte. A Comunidade Intermunicipal (CIM) do Douro é a que mais população perde, em termos demográficos. Verifica-se uma dependência de fundos comunitários no investimento, e as soluções iguais para todo o país acentuam o fosso", apontou o autarca.

"A pandemia obriga-nos a encontrar soluções. A retoma económica para a CIM Douro terá sempre de partir do setor agrícola, em particular do vinho. Estamos a dois meses das vindimas, mas tememos que muitas pessoas não cheguem a colher uvas", acrescentou Carlos Carvalho. "Precisamos de manter os postos de trabalho. Programas de criação de emprego não têm sentido neste momento. Se não tivessem sido as autarquias, durante a pandemia, isto teria sido incomparavelmente pior", sublinhou.

O plano de recuperação económica elaborado por António Costa Silva, a pedido do Governo, é "pouco nacional e pouco coeso", lamentou o autarca de Tabuaço, que vê um motivo de esperança na injeção financeira acordada pela União Europeia para responder à pandemia - mas, vincou, "é fundamental sermos ouvidos sobre como vai ser utilizado o dinheiro".

Em nome da Área Metropolitana do Porto, o presidente da Câmara de Vila Nova de Gaia, Eduardo Vítor Rodrigues, concordou que pode criar-se a "ilusão de que há dinheiro para tudo". "A Região Norte vai ter de encontrar justificação para não conseguir gastar o dinheiro. Temos baixas taxas de execução e programas desenhados de forma inadequada", notou.

Para o edil gaiense, os transportes serão um tema determinante no futuro próximo. "Tem de ser uma prioridade absoluta, a que juntaria a habitação, numa lógica de reabilitação urbana. Mas não há estratégia a partir do Estado, a iniciativa tem partido das câmaras. E aqui destaco o Porto como um excelente exemplo", apontou. O envelhecimento e a pobreza são questões que preocupam Eduardo Vítor Rodrigues, que teceu críticas à utilização da economia social como "joguete ideológico": "Ou valorizamos a economia social, ou as pessoas vão ficar sem serviços. As câmaras não podem continuar indefinidamente a substituir o Estado no apoio ao terceiro setor".

Terminando com um apelo à união, o autarca de Vila Nova de Gaia disse que a Região Norte tem de "juntar as elites dirigentes, empresariais, políticas e das universidades, para obter um entendimento plural como a região". "Nunca teremos força suficiente se cada um se limitar a reivindicar pelos seus problemas. A união dar-nos-á musculatura institucional. Temos de afirmar-nos pela positiva para não nos lamentarmos do centralismo", concluiu.

O presidente da Câmara de Castelo de Paiva, e igualmente líder da CIM do Tâmega e Sousa, Gonçalo Rocha, manifestou "grande inquietação" pelas dificuldades que as indústrias do calçado, têxtil e mobiliário, com muito peso na região, atravessam. "Fala-se de muito dinheiro, mas o desenvolvimento dessas medidas pode demorar muito, o que pode comprometer empresas. Temos de ser rápidos, sob pena de a nossa região poder viver tempos dramáticos", frisou.

"A expansão da ferrovia é um investimento estruturante. Há uma dinâmica diária de deslocação de pessoas para o Grande Porto. Mas também há outras acessibilidades urgentes para concretizar. Sobretudo, precisamos de mecanismos que venham rápido. Temos de simplificar para não chegarmos tarde. Setembro e Outubro são meses que me preocupam", confessou Gonçalo Rocha.

Líder da CIM do Alto Minho, o presidente da Câmara de Viana do Castelo, José Maria Costa, deixou um convite à ponderação: "Precisamos de refletir sobre o nosso futuro comum. Avaliar que efeito está a surtir este quadro comunitário. E avaliar como é que as sub-regiões do Norte estão a crescer. Precisamos de mais espaço para debater e cooperar", apontou.

"A inovação e o conhecimento são fundamentais. Temos de consolidar a rede de universidades, institutos politécnicos e centros de investigação, para vencermos a batalha da qualificação. A mobilidade também é importante. Faz ou não sentido termos uma linha de TGV do Porto a Vigo? A mim parece claramente que faz sentido", acrescentou José Maria Costa.

Para o autarca de Viana do Castelo, é imperativo definir as prioridades de investimento e valorizar o papel das CIM: "Devemos desenhar políticas diferentes, que valorizem o interior e permitam articulação com outras estruturas. Simplificar processos no que diz respeito à contratação pública, endividamento dos municípios, acesso aos fundos". José Maria Costa também gostaria de ver um "pacto concertado para a empregabilidade" e uma revisão da política agrícola comum. "O modelo a nível nacional não é justo para a nossa região", lamentou.

O presidente da Câmara de Braga e da CIM do Cávado, Ricardo Rio, lembrou que, antes da pandemia, "o Norte vivia um excelente momento, de expansão da atividade, captação de investimento e crescimento do emprego. Esta crise será ainda mais profunda do que é hoje. Prevalece a incerteza quanto ao momento do fim", apontou.

"Neste momento importa resistir, sobreviver a este momento, criando condições de sustentabilidade para as empresas. Há setores em situação dramática, e no futuro mais próximo, teremos uma situação social grave", previu o autarca bracarense.

O plano de recuperação económica deverá, segundo Ricardo Rio, "criar respostas às necessidades de muitas pessoas que vão perder rendimentos". "A recuperação não será imediata, por isso não podemos enjeitar oportunidades. Temos de criar condições para uma recuperação sustentável e valorizar o manancial de oportunidades que não foi ainda potenciado", sublinhou Ricardo Rio, listando os aspetos a acautelar no desenvolvimento próximo: "Capacidade de concretização das autarquias locais, autonomia financeira e de investimento, valorizar estruturas de colaboração regional mas não descurar outras estruturas, mais lealdade institucional entre o Estado central e as autarquias, e ultrapassar uma lógica concorrencial entre as instituições".

Em representação da CIM das Terras de Trás-os-Montes, o primeiro secretário Rui Caseiro exortou o país a "arregaçar as mangas e refletir". "Devemos pensar o que queremos para o futuro e avaliar a lógica de aplicação de fundos públicos, que é sempre a mesma e não resolve os desequilíbrios. É preciso que o Estado veja o país como um todo", disse.

"A Europa deu um sinal, mas porque o problema tocou a todos. No país tem de ser igual, com políticas dirigidas a todos. A prioridade são as pessoas. Precisamos de políticas públicas que recuperem a economia e a sua componente social", acrescentou Rui Caseiro, reivindicando também medidas que permitam fixar população na região de Trás-os-Montes: "Precisamos de infraestruturas com ligação às vias estruturantes".

"Não basta dizermos que somos melhores, temos de mostrar que somos melhores. Todos contamos para o todo. Trás-os-Montes contribui para o Norte, e o Norte contribui para o País", concluiu.