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Aquisição de imóvel nas Fontainhas suscita debate na Assembleia sobre stock de habitação municipal

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Rui Moreira anunciou na Assembleia Municipal que vai solicitar aos serviços um levantamento exaustivo dos edifícios municipais alienados em 12 anos de mandato do seu antecessor, confrontando-os com os exercícios de preferência exercidos desde 2016. O presidente da Câmara do Porto considerou que se perdeu muito stock de habitação municipal, que poderia ser hoje útil para debelar a escassez de casas no Centro Histórico. Lamentou, por isso, o voto contra do PSD para a aquisição de um imóvel na zona das Fontainhas através do exercício do direito de preferência, aprovada por todas as outras forças políticas.

A oposição reiterada do grupo parlamentar do PSD ao exercício do direito de preferência sobre imóveis no Centro Histórico, neste caso sobre um edifício localizado na Rua de Gomes Freire, pelo valor de um milhão e cinquenta mil euros deixou os deputados sociais-democratas isolados dos restantes grupos parlamentares, que votaram a favor da proposta do presidente da Câmara do Porto, nesta segunda-feira à noite.

No documento assinado por Rui Moreira, pode ler-se que a aquisição tem como principal finalidade "a manutenção da função social do edificado e dos contratos de arrendamento existentes", que são oito. Desde 2016, tem sido assim: a autarquia utiliza um mecanismo antigo que a Lei lhe confere, denominado direito de preferência/opção, como "amortecedor" da atual estratégia de habitação.

Aplicado "em casos casuísticos e não generalistas" consegue, ainda assim, causar "um grande impacto sobre a população, porque permite fixar moradores com rendas antigas no sítio onde vivem há muito tempo", facilitando também a interação com quem vem de fora, observou o presidente da Câmara do Porto.

Mas o entendimento do PSD nesta matéria é divergente. Segundo o deputado municipal Francisco Carrapatoso, o exercício do direito de preferência, salvo raras exceções, "não resolve problema nenhum nem vai contribuir para o aumento da habitação. Acreditamos que é o investimento privado o motor de desenvolvimento", defendeu.

Contra a ideia social-democrata de que a cidade estaria, pois, tomada pela "coletivização", correndo o risco de se transformar "numa espécie de Europa de Leste ou numa nova Havana", como vaticinou Francisco Carrapatoso, será feito um levantamento de todos os edifícios municipais alienados durante os três mandatos do ex-presidente da Câmara do Porto Rui Rio, anunciou Rui Moreira.

"Só para perceber qual é o stock de habitação. Essencialmente, o património municipal que foi vendido sem moradores e que hoje poderia ser importante para a nossa estratégia de habitação", afirmou. "Enquanto cá estivermos, continuaremos a exercer o direito de preferência. Se depois o PSD voltar [à governação municipal], nessa altura podem vender tudo outra vez", acrescentou o edil.

Em linha com a posição do autarca esteve o deputado da CDU Artur Ribeiro. "Numa altura de grande pressão sobre os inquilinos, é normal - e acho até bastante bem - que a Câmara do Porto utilize o direito de preferência para prevenir despejos", e deu como exemplo recente a aquisição do Bairro Maria Vitorina, também na zona das Fontainhas, onde cerca de 70 famílias permaneceram nas suas casas.

Para o deputado comunista, a valorização do património municipal também sai a ganhar com a aplicação desta medida. "Agora, falamos em comprar; no anterior [ciclo político autárquico], era só vender: vários edifícios na zona histórica foram vendidos por Rui Rio", afirmou Artur Ribeiro, referindo ainda que foi o ex-presidente da Câmara do Porto o responsável pela redução de stock de habitação social com a demolição dos bairros de São João de Deus, de São Vicente de Paulo ou do Aleixo (concluído agora o processo).

"Se vissem qual era o património desta câmara em 8 de janeiro de 2002 e o que era em 2013, viam como é que as dívidas foram pagas", concluiu.

Do PS, o deputado Pedro Braga de Carvalho corroborou que o exercício do direito de preferência "permite mitigar problemas de acesso à habitação" e reiterou o apoio dos socialistas sempre que a medida for apresentada pela Câmara Municipal. "Achamos que não é uma resposta completa, mas é uma entre outras", completou.

Também a deputada do BE Susana Constante Pereira subscreveu a medida, que abre "o combate à especulação imobiliária", entendendo que "deve ser uma ferramenta e não um fim em si mesmo".

Já do PAN, a deputada Bebiana Cunha aprovou a proposta, adjetivando-a de "preventiva e remediativa". Por seu turno, André Noronha, do grupo parlamentar Rui Moreira: Porto, o Nosso Partido, salientou que a medida já integrava o programa eleitoral dos independentes, como resposta a "uma falha de mercado", que não deve ser confundida com habitação social, assinalou.

Rui Moreira defende apoio do Estado para habitação com "cheque de renda"

Durante o debate, o presidente da Câmara do Porto declarou que, embora esteja identificada a necessidade de mais habitação social, "por muitas contas que faça, o Município não tem hipótese de construir 2 000 novas casas".

Ora, como está em curso a elaboração da estratégia local de habitação (processo que Rui Moreira admitiu "muito complexo" devido às diretrizes do Governo), argumentou que "uma nova fileira de habitação social deveria ser construída pelo Estado através do IHRU - Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana".

No entanto, caso haja intenção de transferir o IHRU para a gestão das câmaras municipais, o autarca avisou que a transferência de edificado ou vem acompanhada do cheque respetivo ou colocará graves problemas às autarquias, "mesmo no Porto, onde o parque do IHRU é apenas de mil habitações". Além disso, avisou que esta é uma matéria que merece "algum cuidado para que o munícipe não pense que se pode tornar num peso excessivo".

Como solução intermédia, "se o Estado acha que não é capaz de construir habitação social, então que entregue a quem for capaz de o fazer e tenha os recursos necessários", afirmou o presidente da Câmara do Porto, que propôs a criação de "cheques de renda" (à semelhança do que acontece no programa municipal Porto Solidário).

Nos países em que este modelo tem sido aplicado, "a função social da habitação foi muito acelerada", constatou Rui Moreira. Na prática, consistiria num apoio corrente do Estado à população residente na nova habitação social construída por privados, que também estariam responsáveis pela manutenção do edificado.